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RESENHAS
Paraná épico
Domingos Pellegrini*
MARCELO RUBENS PAIVA
ARTICULISTA DA FOLHA
Domingos Pellegrini, 54, lança seu épico "Terra Vermelha" (Geração Editorial) e faz de Londrina, onde nasceu e mora, a sua aldeia: ele fala da cidade paranaense, contemporânea e de terra vermelha, para falar do mundo.
Pellegrini é um dos grandes nomes do conto brasileiro. Na antologia "Histórias de um Novo Tempo", lançada pelo jornal "Pasquim" durante o regime militar, ele surgiu ao lado de Caio Fernando Abreu (1948-1996).
Seu livro de estréia, "O Homem Vermelho", repercutiu no meio literário e ganhou o Prêmio Jabuti de 1977. Desde então, escreve para jornais, publicidade e participa de outras antologias, como "13 Maneiras de Amar" (Nova Alexandria) e o recente "100 Melhores Histórias Eróticas da Literatura Universal" (Ediouro).
Dedicou-se ao público juvenil, como a maioria de seus colegas. Acabou de lançar o livro de antropologia "No Começo de Tudo" (Nova Alexandria), uma aventura que narra o percurso de nossos ancestrais e os acontecimentos de três gerações de hominídeos.
Pellegrini diz que abandonou os livros juvenis no momento em que se dedicou ao público mais adulto. "O enfoque ficou mais denso", justifica.
Formado em letras pela Faculdade de Londrina, filho de um barbeiro e de uma dona de pensão, Pellegrini, isolado em uma chácara nos arredores da cidade, investe no romance. Em 2000, lançou "O Caso da Chácara Chão" e faturou outro Jabuti.
Prolífico, o autor afirma que também tem quatro livros de poesia prontos, os quais ainda pretende publicar. O que não pretende mesmo é voltar a morar em grandes metrópoles.
"Não consigo morar em São Paulo. Incomodam-me o barulho, a água, e as pessoas não se cumprimentam. Mesmo que eu tenha prejuízo profissional, os benefícios são maiores. Fiquei em São Paulo quatro anos, até 1987", diz Pellegrini, em entrevista pelo telefone.
"Não desassocio a carreira literária da vida. Se eu tiver de viver numa cidade grande para ser escritor, deixo de ser escritor. Gosto de viver bem e não escrevo sob encomenda."
Pioneiros desesperados
"Terra Vermelha" é uma história de amor entre José e Tiana, dois dos primeiros colonos que se estabeleceram no norte do Paraná e foram agentes e sujeitos de sua transformação.
Não faz 50 anos que a inóspita e fértil terra vermelha, coberta por florestas, foi tomada, cultivada e urbanizada. Seus colonizadores? Uma nau de pioneiros desesperados: agricultores das decadentes fazendas de café de São Paulo, retirantes nordestinos, espanhóis, italianos e japoneses que passavam fome em suas terras.
"Se o cara tentar escrever um épico sem ter o que contar, vai cair do cavalo. É que nasci numa terra peculiar, numa cidade que foi planejada pelos ingleses, em que vieram pessoas do mundo inteiro. É uma terra de transformações, que merece um épico", diz Pellegrini.
"Em cinco décadas, Londrina passou pelo processo mais intenso de transformação. Tivemos quatro gerações arquitetônicas. A cada dez anos, parte da cidade é derrubada, e se constrói outra", conta Pellegrini, que vê como os habitantes são influenciados por esse cenário de mutações.
"As transformações econômicas refletem na vida das pessoas. Aqui, o sujeito rebola ou sai do campo. São personagens que têm de encarar desafios. O livro é sobre isso", completa.
Pellegrini divide o livro em sete dias, tal qual Ele fez o mundo. Nestes sete dias e noites, José, tal qual o pai do filho d Ele, conta não apenas o quanto mudou, junto com o país que mudou sua essência rural, em que não se joga mais "triunfo", mas o quanto amou Tiana, a sua Maria.
Diz a lenda que, quando José nasceu, não chorou, nem depois do tapa da parteira. "Nunca vi assim, parece que nem sente dor, não chora, esse vai ser diferente, vai dar o que falar!", ela disse.
No mesmo dia, 80 anos depois, José, agora Nono, está à beira da morte. Foi o único ano em que discursou na ceia de Natal. Reúne toda a família num quarto de hospital para contar sua vida. O autor lembra que José é inspirado em seu avô paterno, e Tiana, em sua avó materna. Muitos personagens do livro são reais. Seus nomes foram sutilmente trocados.
A narrativa vai e vem, como na espiral de outro épico, "Grande Sertão: Veredas", de Guimarães Rosa (1908-1967). O passado é um baralho fora de ordem. O casal monta a Hospedaria Pioneira, recurso do autor para centralizar as muitas histórias da cidade.
Esperavam que a Pioneira fosse, para os novos colonos, "a primeira boa impressão que um homem tem da futura mulher". Passam por ela o comunista Mané Felinto, Zé do Cano e outros.
Getúlio persegue comunistas, como o Muro de Berlim é derrubado. Fatos históricos se misturam à ficção. E, como Guimarães Rosa, ele muda a grafia de algumas palavras e, em certos momentos, ignora a pontuação.
"Já andei demais nessa terra. E asfalto não tem graça", justifica José assim sua aposentadoria. "O primeiro prato mata a fome, o segundo mata a gente", filosofa.
(Resenha publicada originalmente no Jornal Folha de São Paulo)
Sobre o Autor
Domingos Pellegrini:
Nascido em Londrina, Paraná, em 1949, formou-se em Letras. Vencedor do prêmio Jabuti em 1977 (pelo livro O homem vermelho), já teve contos publicados em antologias de diversos países. Também é jornalista e publicitário.
site oficial: SITIO TERRA VERMELHA
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