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RESENHAS
+ 30 mulheres, organizadas por Luiz Ruffato
Luiz Ruffato*
Cristina Zarur, Especial para o Globo Online
RIO - A diversidade é a tônica de "+30 mulheres que estão fazendo a nova literatura brasileira". A antologia de contos, organizada pelo escritor Luiz Ruffato, reúne perfis, estilos e vozes diferentes. Foge da centralização do eixo Rio-São Paulo ao apresentar autoras de várias partes do Brasil. Todas elas publicaram livros a partir da década de 90. Algumas obras obtiveram maior visibilidade, outras menos. São escritoras, com trajetórias e faixas etárias distintas, propondo a liberdade da prosa. Em comum, além do fato de serem mulheres, fazem da linguagem um instrumento de expressão e ofício.
Nos anos 70 e 80 o debate em voga girava em torno da questão "Existe uma literatura feminina?". As escritoras elaboravam respostas: quase sempre discursos irados, argumentos acadêmicos, ou então, soando como álibi ( uma desculpa por ousarem escrever). A pergunta em si camuflava certo menosprezo, como se fosse "menor" a literatura produzida por mulheres. Rotulada como uma ficção introspectiva e intimista, o "feminino" em pauta circunscrevia apenas ao doméstico, abraçando uma visão miúda do mundo.
É preciso contextualizar este debate quando fazia sentido consolidar o conceito de identidade. Hoje o enfoque ganhou nova roupagem e outros estilhaços. A validade da pergunta caducou, pois o movimento feminista adquiriu outros contornos. E mais, as mulheres cansaram de afirmar a existência da própria escrita. Para que ficar se explicando a todo momento? A época atual demonstra que os apelos de "igualdade" migraram para os territórios das "diferenças". "30 mulheres que estão fazendo a nova literatura brasileira" é um expressivo mosaico de diferenças. Os contos apresentam temáticas variadas e não estão engessados num pseudo-denominador comum, a tal desgastada "literatura feminina". São registros de múltiplas vozes.
Ao colocar expressão "a nova literatura brasileira" no título da coletânea, Ruffato instiga o leitor. Como, quais novidades? Mas o mérito de originalidade, não se enquadra na proposta do livro. O recorte do "novo" passa pelo sentido temporal, refere-se àquilo que apareceu recentemente no cenário literário. A antologia propõem um panorama do que está sendo produzido.
Para conhecer um pouco da visão destas escritoras foram elaboradas duas perguntas, igualmente dirigidas a todas. Veja no que deu em matéria abaixo.
Leia algumas respostas:
Rosângela Vieira Rocha
1) Fiquei muito honrada com o convite para participar dacoletânea, especialmente por ser uma maneira de contribuir para uma maior visibilidade da literatura feita atualmente no Distrito Federal, que, embora de qualidade, é ainda pouco conhecida no resto do País. Sendo um país de dimensões continentais, o Brasil possui uma cultura riquíssima.
2) O conto "A oitava onda" se insere no panorama das inquietações femininas de que tratam meus dois livros anteriores, "Véspera de lua" (romance) e "Rio das Pedras" (novela), dando continuidade a questões que venho abordando desde que comecei a escrever. Nessa nova literatura, com mulheres do novo milênio e seus problemas e aspirações, procuro dar ao leitor uma visão lúcida, bem-humorada, verdadeira, algo que retrate a opressão sofrida pela mulher.
Adriana Falcão
1) Eu me sentia meio desenquadrada. Escrevo para TV, para cinema, crônica, livros para crianças, para adolescentes, para adultos, e me perguntava o que eu era realmente, se é que eu era alguma coisa. Ver o meu nome junto do destas mulheres que provavelmente têm que se virar, como eu, mas fazem literatura,me fez descobrir o óbvio. Sou uma mulher que faz literatura. Só isso. Fiquei muito orgulhosa de mim.
2) Mais uma vez a minha dificuldade de entender o meu lugar.Quando leio artigos sobre "a nova literatura brasileira",sempre penso: será que eu faço isso? texto bom é bom, indepedente de quando, onde ou por quem foi escrito. Talvez este argumento seja apenas uma desculpa para eu me sentirmais à vontade na coletânea. Se for, que besteira a minha.
Andréa del Fuego
1) Significa que há espaço, e o melhor, há novos leitores para novas vozes, dado o sucesso da primeira edição da antologia. A literatura constrói o imaginário de uma nação em plena construção de sua identidade, nada mais representativo que escritores que também estão em construção de sua narrativa, deseu nicho.
2) Minha narrativa é uma literatura acessível que pode se desdobrar em vários significados dependendo da cognição doleitor. Não sou erudita, sou contemplativa e tento conduzir o leitor para a minha janela, ver o que eu vejo.
Doris Fleury
1) É alargar a janela de leitores que assiste ao meu trabalho. Pouquíssima gente lê no Brasil, e até agora publiquei apenas dois livros. Às vezes sinto frustração ao consatar como é pequeno o alcance do que escrevo. Literatura existe para mudar o ser humano; se as pessoas não me lerem, de que valerá meu trabalho? O formato de coletânea tem várias características positivas: além de ser perfeito para revelar novos autores, apela para o coletivo, junta pessoas que fazem literatura.
2) Talvez esteja na contramão dela, no sentido de que não escrevo para revolucionar a linguagem. Escrevo sem grandes preocupações estilísticas, porque meu primeiro objetivo ésempre o conteúdo, nunca a forma. Do ponto de vista social, meu universo é o da classe média empobrecida, cheia de vícios autoritários, ainda agarrada às suas ilusões e preconceitos, e sofrendo com as novas exigências de um mundo em que não se conhece.
Sobre o Autor
Luiz Ruffato: O jornalista e escritor Luiz Ruffato, autor de dois livros de contos, Histórias de remorsos e rancores (Boitempo, 1998) e (Os sobreviventes) (Boitempo, 2000), ambos elogiados pela crítica e pelo público, é hoje um dos grandes autores que apareceram no fim dos anos 90. Nasceu em Cataguases (MG), em 1961, cidade que abrigou o Grupo Verde, criador da efêmera (1927 a 1929) e importante revista modernista Verde. Ruffato também publicou três livros de poesias, cujos títulos ele sequer ousa se lembrar. Continua a escrever versos, tendo, inclusive, um livro de poesias pronto para publicação, As máscaras singulares, e ocupa a Secretaria de Redação do Jornal da Tarde.
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CARASSOTAQUE, por Luís Augusto Fischer.
CARASSOTAQUE é um romance cujo tema central é o medo; o medo generalizado, silencioso e coletivo de toda a população de um local (imaginário), um país chamado Austral-Fênix, no qual os habitantes nativos perderam suas faces e suas cabeças. Ali apenas os estrangeiros mantém suas cabeças e vêem a todos os circunstantes com elas. E são vistos pelos habitantes locais também com suas próprias cabeças, daí serem apontados como os carassotaques. O livro é uma metáfora sobre o poder, sobre o autoritarismo demagógico, sobre a atmosfera opressiva e secreta que envolve e domina a todos, sobre a xenofobia, sobre o racismo e a discriminação contra os estrangeiros (ou todos os indivíduos que sejam considerados diferentes). Leia mais