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RESENHAS
Tradutores traidores
Agenor Soares de Moura*
O exame das traduções pode servir para a compreensão de hábitos e vícios culturais, como demonstra Agenor Soares de Moura(1901-1957) no valioso À Margem das Traduções. O livro compila toda a colaboração do professor mineiro no jornal Diário de Notícias, de 1944 a 1946, e revela a erudição e a argúcia crítica de quem seria um dos melhores tradutores brasileiros, e mesmo o "tradutor ideal", na autorizada opinião de Paulo Rónai. Enviados regularmente de Barbacena, onde passou sua vida discreta e provinciana, os artigos de Soares de Moura apontavam defeitos, aberrações, desconhecimento da língua estrangeira e da portuguesa.
Monteiro Lobato foi um dos mais criticados tradutores. A propósito de O Homem Invisível, de H.G. Wells, o crítico comenta: "Tem-se quase a impressão de que o grande escritor paulista lia um capítulo, apanhava-lhe o conteúdo e depois exprimia, com maior ou menor exação, o assunto do mesmo". Mais tarde, ao comentar A Queda de Paris, de Ilya Ehrenburg, também traduzido pelo autor de Urupês, afirma que provavelmente ele "não teve à mão um dicionário francês". Para o crítico, a autoridade de um escritor não basta para a criação de novas palavras, quase sempre ocultando conhecimento insatisfatório da língua.
Farpas não faltam a escritores como Érico Veríssimo e Lúcio Cardoso. Adonias Filho cometeu traduções das mais reprováveis e tinha o hábito de utilizar uma segunda língua estrangeira. Foi o caso de Gaspar Hauser, como em português ficou conhecido o romance alemão de Jacob Wassermann, na tradução que Soares Moura provou ter sido feita a partir da francesa.
É impressionante que obras importantes, a exemplo de Morte em Veneza, de Thomas Mann, tenham influenciado gerações quando seus textos em português estão repletos de adulterações e deturpações. É como se houvesse um family skeleton, um segredo desagradável, na vida intelectual brasileira. (Texto de Felipe Fortuna, para Revista Época - Parceria Livraria Cultura)
Sobre o Autor
Agenor Soares de Moura: Agenor Soares dos Santos é diplomata aposentado. Formado pela UFMG, foi o primeiro professor de Inglês e Literatura Inglesa e Norte-Americana da PUC de Belo Horizonte. Seu Guia Prático de Tradução Inglesa é um desenvolvimento de estudo pioneiro de falsos cognatos que ele realizara em 1977, como monografia universitária. Lexicógrafo especializado em Inglês e em estudos comparativos. como este e como o Dicionário de anglicismos lançado, em 2005, pela mesma editora, dedica-se a trabalhos de orientação de tradutores - com destaque para a tradução literária - e tem em preparo outras obras dessa natureza.
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