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INVICTOS

por Pablo Morenno *
publicado em 27/05/2006.

Após escalar pela segunda vez o monte Everest, já no retorno, morreu Vítor Negrete, 38 anos. Sua primeira escalada foi com oxigênio suplementar. Na segunda, escolheu a face norte - a mais difícil - e dispensou o auxílio, único brasileiro a realizar essa façanha.

Que pode almejar um alpinista depois de alcançar o topo do maior monte do mundo? Subir o mesmo monte, do jeito mais difícil. Se a primeira escalada teve oxigênio suplementar, agora o dispensaria. Na outra vez, fora pelo lado mais ameno, agora subiria pelo mais íngreme. 38 anos é muito pouco para dispensar novos desafios.
Aposentaram o Concorde, e já apareceu um novo modelo. Inventamos carros mais velozes, remédios mais eficazes, teorias mais completas. Ninguém há de dizer: agora basta. O homem, o homem autêntico, é superação de desafios, construção contínua, autopoiese* eterna.

Quem sabe esse desejo de superação constante seja um trauma por não sermos divinos. Ou, dirá um teólogo, um sinal de que o somos realmente. Um ateu, por sua vez, argumentará em favor da projeção inconsciente de si mesmo. Afora as explicações, sempre parciais, está a realidade: o homem autêntico quer superar constantemente seus limites, sem medo dos riscos, sem medo da morte.

Se é certo que é próprio do homem a superação dos limites, também é certo de que somos limitados. A contradição existe, faz parte da vida. Chega um momento e, zás!, o limite se impõe, atira-se à nossa frente, atravanca o caminho. Aconteceu com Negrete, aconteceu com Airton Sena naquele dia sinistro, acontece comigo e com você. Algo ou alguma coisa irrompe. Este algo, contraditoriamente, é previsível, mas não esperado. Trata-se do risco. Mas, contraditoriamente de novo, é apenas ele que torna valiosa a conquista. Um herói, infelizmente, não é feito de nenhuma outra coisa, exceto de risco.

O povo aplaude o bombeiro que enfrentou o fogo, o astronauta que voltou intacto, o tenor que cantou um trecho difícil, o atleta que dominou o corpo. Já vi, também, homenagem a um bombeiro morto em incêndio, aos astronautas que não voltaram, a um atleta lesionado, a um tenor rouco. Isto demonstra que herói não é apenas o vencedor, mas quem se dispôs à vitória.

Vítor Negrete morreu retornando. Chegou ao topo com dificuldades propostas por si mesmo. Muitos o criticaram por seu heroísmo inútil, por sua falta de causas, por sua excessiva obsessão. Como na literatura, há feitos humanos despidos de utilidade. São confeccionados de sentidos e não de explicações, postam-se na mística, não na razoabilidade. Pense nos monges tibetanos, próximos ao Everest, cujas vidas são despidas de utilidade e, aparentemente, se desperdiçam na solidão.

Certos feitos existem para desconcertar, intrigar, soltar pelas planícies os cavalos do absurdo. Sua função é símbolo, paradigma, metáfora do demasiado humano. No caso de Vítor Negrete, o desejo impetuoso de alcançar a qualquer custo o cume do sonho sonhado, inclusive, sacrificando por ele todos os outros. A morte, limite, nos inveja e, sorrateiramente, ataca na volta. Caímos, mas, como Vitor, invictos.
....
*Autopoiese - criação, construção de si mesmo. A palavra "poiese", muitas vezes, é usada em oposição à "mímesis", imitação. Enquanto "mímesis" representa reprodução, a "poiese" seria criação do novo.

Sobre o Autor

Pablo Morenno: Pablo Morenno nasceu em 21.05.1969, em Belmonte, SC, e mora em Passo Fundo, RS. É licenciado em Filosofia e bacharel em Direito. Também é professor de Espanhol em cursinhos pré-vestibular, músico e servidor público federal do Tribunal Regional do Trabalho/4ª Região, e pinta nas horas vagas. Escreve uma coluna semanal de crônicas no jornal O Nacional, de Passo Fundo RS, e Nossa Cidade de Marau-RS. Colabora com os jornais Zero Hora, Direito e Avesso, e com sites de leitura e literatura. É Membro da Academia Passofundense de Letras, ocupando a cadeira cujo patrono é Érico Veríssimo. Como animador cultural e escritor, participa de projetos de leitura do IEL- Instituto Estadual do Livro do RS e de eventos literários no Rio grande do Sul e Santa Catarina. Com suas palestras interdisciplinares e descontraídas, utilizando-se de histórias e da música, conversa com crianças, jovens, pais, professores e idosos sobre a importância da leitura e da arte na vida.

Livros publicados: POR QUE OS HOMENS NÃO VOAM? Crônicas, WS Editor e MENINO ESQUISITO, Poesia Infantil, WS Editor. Contato com o Autor: Pablo Morenno

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