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Roaldo, o avô

por Airo Zamoner *
publicado em 24/04/2006.

Roaldo Neto foi surpreendido pelo filho pequeno enquanto passeava pelo setor histórico da cidade. O menino gaguejou sílaba por sílaba enquanto lia as placas azuis de cada esquina. Descobriu que a rua em que estavam se chamava Avenida Jaime Reis. Puxou a manga do pai distraído que custou a atendê-lo. Queria saber quem era o tal de Jaime e porque tinha uma rua com seu nome. Foi logo emendando:

– Pai! Qual rua tem o nome do vô Roaldo?

Roaldo, o avô, estava perplexo. Tinha certeza que estava na Avenida Cruzeiro, na região histórica da cidade, mas havia algum tipo de briga com sua memória.

Região histórica? As placas indicavam Avenida Jaime Reis. Onde foi parar a Avenida Cruzeiro? A pergunta martelava sua memória cansada. Mas a imagem do corpo sendo carregado pelos policiais insistia em tomar o primeiro plano. Quem teria morrido daquela maneira tão trágica?

– Não, meu filho! Não tem rua alguma com o nome do vô Roaldo.

Roaldo Neto queria saber por quê. O pai explicou. Nome de rua era uma homenagem a ilustres cidadãos que fizeram alguma coisa importante para a cidade, ou para o país. E tentou se esquivar, dizendo que iria entender melhor estas coisas quando crescesse e se tornasse um estudante como aqueles que estavam de uniforme, descendo a Jaime Reis.

Roaldo, o avô, foi envolvido pelo intenso e súbito corre-corre. A aglomeração de pessoas aumentava minuto a minuto. As luzes alucinantes das viaturas assustavam mulheres e aguçavam a curiosidade dos homens. A insistente sirene antiga derretia-se pelos ouvidos atentos. Uma pergunta surgia de todas as bocas. O que estaria acontecendo?

Abrindo caminho na multidão, um grupo de policiais silenciosos carregava às pressas para dentro da ambulância um corpo inerte. A notícia não demorou a se espalhar. Pessoa importante acabava de ser assassinada na saída de um dos mais famosos cinemas de Curitiba. Nunca se dera bem com aglomerações. Assim que foi empurrado no primeiro encontrão, subiu correndo para a praça Tiradentes, atravessou-a num pulo indo em direção ao bairro do Juvevê.

– E o Jaime, pai? Quem foi ele?

Roaldo lembrava de antigas conversas com o pai sobre um assassinato ocorrido em 1912 e que ele presenciara na saída de um cinema. Algo lhe dizia que esta história tinha a ver com o nome daquela rua.

Desolado, Roaldo, o avô, sentia um certo desconforto por ter fugido tão prematuramente da confusão. Resolveu voltar. Afinal, precisava saber quem havia sido morto daquela maneira. E aonde, diabos, foi parar a Avenida Cruzeiro?

– Pai! Você não vai me responder? – insistiu o filho.

Roaldo se limitou a dizer que estava pensando, que logo iria lembrar quando o velho encarquilhado, costas excessivamente curvadas, bengala de ponta desfiada, óculos pequenos e certa angústia no olhar perguntou:

– Meu rapaz, poderia me dar uma informação?

Roaldo se colocou à disposição. O velho o fitou demoradamente e algumas lágrimas deslizaram por entre as fundas rugas. Colocou as mãos no peito, depois olhou para o Roaldo Neto. Estendeu a mão para afagar-lhe a cabeça, mas recuou. Roaldo insistiu sobre a informação que ele precisava e se estava se sentindo bem. O velho apenas fez um gesto com a mão. Não precisava mais. Agora já lembrara o que havia acontecido com a Avenida Cruzeiro.

– Pai! Este velho é parecido com o vô Roaldo das fotografias, não é?

Roaldo ficou olhando o velho se afastar, descendo em direção ao centro.

– Você faz muitas perguntas, filho!

– Mas você não responde nenhuma...

– Qual foi a pergunta que eu não respondi?

– A do Jaime...

– Ah, sim! O Jaime, da Avenida Jaime Reis, não é? Jaime Drumond dos Reis foi escritor, jornalista e também político aqui de Curitiba. Morreu assassinado na saída de um cinema há muitos anos. Para homenageá-lo, trocaram o nome da Avenida Cruzeiro para o dele.

– Como foi que você lembrou tudinho agora?

– Foi aquele velho que pediu informação. Lembra que ele falou da Avenida Cruzeiro?

– Que velho, pai? Você só mostrou os estudantes. Não encontramos nenhum velho aqui hoje!

Sobre o Autor

Airo Zamoner: Airo Zamoner nasceu em Joaçaba, Santa Catarina, criou-se no Paraná e vive em Curitiba. É atualmente cronista do jornal O ESTADO DO PARANÁ e outros periódicos nacionais. Suas crônicas são densas de conteúdo sócio-político, de crítica instigante e bem humorada. Divide sua atividade literária entre o romance juvenil, o conto e a crônica, tendo conquistado inúmeros prêmios e honrosas citações.

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