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A dama brasileira do crime

por Luis Eduardo Matta *
publicado em 29/06/2005.

Ao me deparar, durante uma visita casual a uma livraria carioca, no ano passado, com o livro 25 mulheres que estão fazendo a nova literatura brasileira (Record; 368 páginas; 2004), compilação de contos organizada por Luiz Ruffato, duas ausências me saltaram, de imediato, aos olhos. A primeira foi a de Angela Dutra de Menezes, autora de obras como Mil Anos Menos Cinqüenta e O Avesso do Retrato, que acabou (com o ótimo conto “Teoria Freudiana do Medo”) incluída, agora, na continuação da coletânea, intitulada Mais 30 mulheres que estão fazendo a nova literatura brasileira (Record; 304 páginas; 2005). A segunda ausência – um pouco mais sentida, até –, foi a de uma autora, não propriamente nova em termos de carreira, mas que vem imprimindo, de certa maneira um pouco na contramão dos escritores em atividade, uma marca própria e independente no panorama literário brasileiro: Vera Carvalho Assumpção.

Conheci Vera Carvalho Assumpção no final de 2003, quando ela preparava-se para lançar seu primeiro romance policial, o instigante e surpreendente Paisagens Noturnas (Landscape; 198 páginas; 2003), já devidamente analisado aqui no Digestivo Cultural, em maio de 2004, numa bela resenha assinada pelo meu querido colega Fabio Silvestre Cardoso. Interessei-me pelo livro de pronto, não apenas por ser um grande leitor de ficção policial e de suspense, como principalmente por enxergar na sua chegada às livrarias, um reforço nas fileiras da ainda escassa Literatura brasileira de entretenimento, a dita LPB, um tema recorrente nos meus artigos e de cuja defesa não abro mão. Muita gente, certamente, não se deu conta disso, mas o fato é que Paisagens Noturnas inaugurou uma linguagem nova dentro da Literatura policial nacional, ao abordar questões caras à atualidade (mundo das drogas, deterioração das relações familiares, violência nas grandes cidades brasileiras, no caso, São Paulo), sem, contudo, resvalar para a estética marginal e, por vezes, árida e repulsiva que tem marcado a prosa de muitos ficcionistas devotados à temática do submundo urbano e do crime. Vera brinda os seus leitores com um estilo refinado; limpo, porém não asséptico e, por isso mesmo, não-limitado. Ou seja: a sua linguagem elegante não impede, absolutamente, que sejam postos em relevo todos os matizes da nossa múltipla e ensandecida sociedade, das angústias humanas cada vez mais pungentes, dos inevitáveis conflitos pessoais numa atualidade ferreamente competitiva e individualista, enfim: todos os ângulos da realidade, muitos dos quais preferimos ignorar diariamente em nome de um ideal de felicidade, beleza e segurança.

Vera Carvalho Assumpção acertou em cheio ao abraçar a Literatura policial, tornando-se, talvez sem saber, a única escritora-mulher em atividade no gênero no Brasil, a nossa “dama do crime”. Com isso, ela criou um dos mais simpáticos personagens surgidos na ficção nacional nos últimos tempos: o detetive Alyrio Cobra, protagonista de Paisagens Noturnas, um legítimo flâneur paulistano, amante da boa conversa e do bom vinho, além de um espectador atento da vida e da paisagem da sua amada São Paulo. Alyrio está, também, presente em Formas Fragilizadas e O Rigor da Forma, duas ótimas tramas policiais – que tive o privilégio de ler ainda nos originais –, previstas para serem lançadas em breve. Percebe-se na narrativa de Vera Carvalho Assumpção um somatório de influências, que vão de Patrícia Highsmith a Ruth Rendell, passando por Simenon e Dashiell Hammett. Seu protagonista, no entanto, guarda inegáveis semelhanças com Pepe Carvalho, o célebre dublê de detetive e gourmet criado pelo catalão Manuel Vázquez Montalbán, estrela de livros como Os Mares do Sul e Assassinato no Comitê Central.

Dada a maneira como ela conduz a narrativa, mantendo um clima de suspense constante e construindo com maestria suas galerias de personagens, podemos afirmar, sem exagero, que Vera Carvalho Assumpção é uma voz inovadora e necessária na nova Literatura brasileira de mistério. Mas, engana-se quem pensa que a sua carreira está circunscrita ao âmbito da ficção policial. A trajetória da “dama brasileira do crime” como escritora já conta mais de duas décadas e é pontuada por iniciativas ousadas e lances inusitados. A estréia de Vera na Literatura aconteceu em 1983, com a publicação do romance Maria Eugênia, pelas Edições Excelsior, divisão da finada editora T. A. Queiroz, que narra os conflitos de uma mulher, Maria Eugênia, dentro de um casamento convulsionado. O livro é, de certo modo, um libelo feminista entremeado por linhas de profunda introspecção psicológica, uma narrativa perturbadora da qual não se sai incólume após uma leitura atenta.

Escritora incansável e grande empreendedora, ao longo desses mais de vinte anos, Vera foi agraciada com diversos prêmios obtidos em concursos literários, aqui e no exterior, como o da Universidade de Évora, em Portugal, o Gralha Azul – patrocinado pelo extinto Banestado do Paraná –, e um honroso segundo lugar no Guimarães Rosa, da Radio France Internationale, o que não é pouco. Mas, foi em 1993, que teve lugar um dos episódios mais curiosos de toda a sua carreira: a abertura de uma pequena editora, a Papa-Formiga, para a publicação de uma série de livros intitulada A Saga de Sofia. Escritos pela própria Vera e assinados com o sugestivo pseudônimo de Mila Oakley, a saga era algo como um equivalente brasileiro das famosas histórias de Angélica (Angélica, Marquesa dos Anjos; Angélica e o Rei; A Revolta de Angélica; etc.), idealizadas pelo casal francês Serge e Anne Golon e que cativaram legiões de leitores mundo afora. A diferença era que, em lugar da França do século XVII, A Saga de Sofia se passava numa São Paulo distante no tempo, quando esta deixava de ser um pouso de tropas e começava a se formar como cidade. Trabalhando praticamente sozinha (até as capas dos livros foram feitas por ela), Vera chegou a publicar dois títulos da série com êxito, mas diversos problemas de ordem pessoal a impediram de tocar a empreitada e a editora acabou fechando as portas. Mas, talvez não fosse má idéia reabri-la. As histórias publicadas de A Saga de Sofia (Os Suplícios de uma Provinciana e A Chegada entre os Papa-Formiga) são para lá de interessantes, adocicadas como convém a um bom folhetim, porém emolduradas por uma rica ambientação histórica e, naturalmente, pedem uma continuação.

Atualmente, além dos romances policiais, Vera Carvalho Assumpção vem se dedicando, com igual afinco, à Literatura juvenil e já conta com dois livros publicados. O primeiro deles é o envolvente Viagem Virtual (Larousse; 112 páginas; 2004), cuja história gira em torno de Camila, uma menina de treze anos que, através de fotografias deixadas por sua falecida e querida avó no computador, embarca com ela por uma fascinante incursão à tranqüila São Paulo do século XIX. Já no segundo livro, recém-lançado, Na Caravela Virtual (Larousse; 98 páginas; 2005), Vera conta a história do menino Pedro, que vai com sua tia a uma lan house, fazer um trabalho para a escola. Lá, eles experimentam um novo super-computador, entram num site e acabam parando dentro de uma das históricas expedições guarda-costas. Estas expedições, organizadas pela coroa portuguesa entre 1516 e 1528 e comandadas pelo fidalgo português Cristóvão Jacques, tinham por objetivo policiar a costa brasileira contra a ação de corsários estrangeiros, principalmente franceses. No livro, Pedro e a tia encontram piratas roubando pau-brasil, vistoriam feitorias e vivem várias aventuras. Tangencialmente, Vera mostra, entre outras coisas, um pouco da gênese da raça brasileira com índios e europeus e a devastação das matas, com a exploração predatória do pau-brasil e o seu contrabando sistemático. Na Caravela Virtual, além de um livro saboroso, nos apresenta um período decisivo – e pouquíssimo estudado – da nossa História, já que foi o fracasso das expedições guarda-costas (insuficientes para patrulhar todo o extenso litoral brasileiro) que deu início ao povoamento do país, visto, então, como a única solução para afastar a ameaça dos corsários.

Por tudo o que conheço de Vera, por toda a sua cultura, criatividade, determinação e dinamismo, não creio ser demasiado afirmar que ela é uma escritora que exerce a sua vocação por inteiro, entregando-se plenamente a todas as vertentes da criação literária e auferindo indiscutíveis vitórias, ainda que estas não tenham sido – ainda – devidamente contabilizadas pela mídia e pelo imaginário coletivo. Esperemos que Luiz Ruffato, caso dê prosseguimento à sua série sobre as novas escritoras brasileiras, assim como fez, recentemente, com Angela Dutra de Menezes, da próxima vez preste mais atenção em Vera Carvalho Assumpção, que embora não seja – volto a dizer – uma escritora “nova”, tem muito de novo a oferecer à nossa Literatura. Afinal é de bons contadores de histórias, desvinculados da volúpia dos hermetismos intelectuais e distantes dos devaneios experimentais, que estamos necessitados, acima de tudo.

Resenha originalmente publicada no DIGESTIVO CULTURAL

Sobre o Autor

Luis Eduardo Matta: Luis Eduardo Matta nasceu no Rio de Janeiro em 1974. É autor de romances de suspense e espionagem. Sua estréia na literatura aconteceu em 1993, com "Conexão Beirute-Teeran", uma narrativa policial ambientada no pós-guerra do Líbano, com prefácio de Mansour Challita. "Ira Implacável" é o seu segundo romance. Site oficial: www.lematta.com

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