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A VOLTA DE PAUL VERHOEVEN, ADAPTAÇÃO FALHA E O ESPLENDOR CÔMICO DE BILLY WILDER
por Chico Lopes
*
publicado em 20/08/2008.
Diretor talentoso ele sempre foi, de fato, mas depende muito do gosto (e do grau de civilidade) de cada espectador o que achar de seus filmes, já que abusa da violência e do sexo e sempre teve detratores e admiradores na mesma proporção - suas tintas grotescas às vezes beiram a genialidade, às vezes degeneram em puro abuso. E com A espiã, co-produção Holanda/Alemanha de 2006, a bem da verdade, não se pode dizer que ele tenha mudado muito.
É a história da judia Rachel Stein, cantora de cabaré que, na Holanda, se refugia do nazismo na casa de uma família cristã que a trata mal e depois tenta uma fuga paga com a própria família e outros judeus. Mas, não era nada mais que uma cilada - os nazistas matam e pilham todos, só ela conseguindo mergulhar num rio e escapar. Entra para a Resistência e, devido à beleza, é feita espiã, a pedido de um chefe, Hans, com quem tem um namoro. Sua infiltração entre as hostes alemãs se dá devido à atração sexual que exerce sobre um comandante, mas não terá um só momento de alívio porque, enquanto ela atua por um lado, por outro a Resistência possui algum agente duplo sabotando os planos. O filme evoluirá numa alternância entre thriller e melodrama, com todas as reviravoltas, o suspense e as surpresas (de identidade) do gênero. Ninguém pode reclamar: é eficiente, tem boa fotografia, bons atores e funciona muito bem dentro daquilo a que se propõe.
O mau gosto de Verhoeven, no entanto, dá as caras no intolerável banho de fezes da heroína, chupado diretamente do banho de sangue de porco sofrido por Carrie em "Carrie - a Estranha" de Brian de Palma. E há uma cena de que poderíamos ter sido poupados - a do chefe nazista Franken desfilando em nu frontal, repulsivo, desinibido e mandão, entre a espiã e a amante dele, uma holandesa oportunista. Também a heroína pinta seus pêlos púbicos de louro, numa cena muito comentada.
Essas coisas não parecem senão ingredientes apelativos com que Verhoeven esperava, na certa, tornar mais polêmico e escandaloso o seu filme que, de resto, segue o esquema manjado de história da Segunda Guerra Mundial feita com competência - experimentado, sabe que o espectador fará a fama da produção é a partir dessas visões lastimáveis. Mas a atriz Carice van Houten é um achado - muito bonita e talentosa, segura a história toda com garra e dignidade admiráveis. E outro ator digno de nota é Sebastian Koch, alemão, que interpreta o amante nazista de Rachel. Ele também pode ser visto como o dramaturgo vigiado pela Stasi no alemão "A vida dos outros". Koch, tal como Carice, tem um charme que o predestina a uma carreira de maior fôlego internacional, se quiser.
O AMOR APÁTICO DE MIKE NEWELL - "O amor nos tempos do cólera", romance de Gabriel Garcia Marquez que foi best seller no Brasil, em adaptação dirigida por Mike Newell, também já anda pelas locadoras, e deverá ser bem locado, pela aura de prestígio da produção.
Mas quem o procurar esperando encontrar o livro de Marquez bem adaptado terá razões para ficar irritado. O filme não encontrou o tom do escritor de modo algum. Tem méritos, porém, e dois dos maiores cabem a dois brasileiros: Antonio Pinto, que compôs a bela trilha sonora, e Affonso Beato, que fez a fotografia. O elenco é multinacional e tem seus acertos, mas achei a atriz italiana Giovanna Mezzogiorno, que interpreta Firmina, apenas bonita, nada passional e intensa como o personagem pediria. A nossa glória nacional, Fernanda Montenegro, tem um bom papel, o da mãe do herói, mas não brilha como seria esperado, na certa por falha da direção. O pai de Firmina, vivido por John Leguizamo, está muito mal caracterizado, bem como é fraco o ator que faz Florentino jovem (parece um daqueles inúmeros bonitinhos descartáveis que estréiam em telenovelas brasileiras e desaparecem sem deixar rastros). Há pontas curiosas, como a da bela Laura Harring, a estrela morena do grande "Cidade dos sonhos", de David Lynch. Fica difícil reconhecê-la, porque parece uma latina mais para gorducha, sem um pingo do glamour que esbanja no filme de Lynch.
Na verdade, o filme só cresce e ganha interesse é em seu miolo, quando o atorzinho que faz Florentino jovem desaparece e surge Javier Bardem. Só ele mesmo salvaria as coisas - consegue ser insinuante, malicioso, cafajeste e romântico e tudo que Florentino tem que ser. É o verdadeiro representante de Garcia Marquez na produção - ele sim entendeu o que tinha de ser feito. Mas o diretor inglês Newell não, tanto que o final do filme, com aquele barco, parece um involuntário comentário irônico sobre o conjunto: a produção ficou meio à deriva. E poderia terminar daquele jeito ou de outro, porque, a esta altura, já se esvaziara em interesse.
A fotografia e o figurino e a reconstituição de época funcionam bem, a música envolve e Javier Bardem vale a locação. Mas, não é o que se esperava.
BILLY WILDER EM ESTADO DE GRAÇA - Em matéria de amor, prefira um clássico, que pode ser encontrado em locadoras que não têm preconceitos cretinos do tipo não dispor de filmes em preto e branco em suas prateleiras. O clássico é Amor na tarde (Love in the afternoon), de 1957.
Por razões que acho obscuras, é um dos filmes mais saborosos e menos vistos do grande Billy Wilder. Há quem avente que a história é deprimente e cínica, por mostrar Gary Cooper cinqüentão, envelhecido (ele estava magro e doente, e morreria poucos anos depois dessa filmagem), apaixonado por uma Audrey Hepburn que parecia muito jovem, jovem demais para ele. A crítica Pauline Kael, por exemplo, escreveu que estava na cara de Cooper o constrangimento por interpretar um papel daqueles. Mas foi exagero - dela e de outros comentaristas.
Porque Cooper está apropriado como sedutor maduro, ainda que fotografado com filtros e indulgências. Ele é americano milionário, Frank Flannagan, famoso como Don Juan cosmopolita, que está em Paris, e é vigiado por um detetive particular especializado em flagrantes de adultérios. O detetive é Maurice Chevalier. Que ator! Ele, na verdade, acaba tendo o grande papel masculino do filme, por sua graça, verve, malícia e classe. É pai de uma garota, Ariane, que estuda violoncelo. Ouvindo conversas e mexendo em arquivos, ela descobre que ele está à caça de Flannagan, e, pelas fotografias, o acha muito charmoso, e decide preveni-lo quanto a um marido que pretende matá-lo, flagrando-o com sua esposa num quarto do Ritz.
A especialidade de Flannagan é "executar" mulheres casadas ao som da valsa "Fascinação" executada por um quarteto de músicos ciganos que leva consigo por toda parte. É um absurdo, mas rende comicamente. O filme tem uma elegância e uma malícia indescritíveis - de um diálogo inteligente salta-se para um diálogo inteligente, tudo tem interesse, tudo evolui com uma inteligência visual a toda prova, tudo palpita, e, embora seja longo, ninguém percebe o tempo passar e nem se reclama de nada. Um prodígio: uma comédia romântica que consegue de fato fazer rir e sonhar. Há quanto tempo não se vê isso? As comédias de hoje em dia dão raiva - que sejam bobas, isso se perdoa (grandes filmes de Hollywood foram, em essência, bobagens), mas o imperdoável é que são chatas, não fazem rir de modo algum.
Confesso que, para mim, esse Wilder, que eu também não conhecia bem, foi uma descoberta. O filme reluz e, embora tenha a trilha sonora e outras referências muito datadas, é tão irônico e sedutor que sua atualidade é incontestável.
Sobre o Autor
Chico Lopes: Chico Lopes é autor de dois livros de contos, "Nó de sombras" (2000) e "Dobras da noite" (2004) publicados pelo IMS/SP. Participou de antologias como "Cenas da favela" (Geração Editorial/Ediouro, 2007) e teve contos publicados em revistas como a "Cult" e "Pesquisa". Também é tradutor de sucessos como "Maligna" (Gregory Maguire) e "Morto até o anoitecer" (Charlaine Harris) e possui vários livros inéditos de contos, novelas, poesia e ensaios.Mais Chico Lopes, clique aqui
Francisco Carlos Lopes
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