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No Balanço Da Rede
por Rubens Shirassu Júnior
*
publicado em 03/09/2005.
Eu tentava fixar o homem deitado na rede e, o gato imóvel e atento com os olhos ao jogo de intensa luz e nenhum sopro de vento. Eu estava passando pela calçada. Pode ser um momento feliz, e em si mesmo talvez fosse, e aquele singelo quadro de natureza morta me fez bem, mas uma fina, indefinível angústia saudade me vem misturada com essa imagem fotográfica. A camisa de algodão, a bota sete léguas marrom avermelhada, a velha calça azul e desbotada. Eu devo estar saudoso quando vi o homem deitado na rede e seu gato na varanda, mas deixei minha pouca alegria para mirar com um vago sorriso perdido no espaço. Era um instante de graça e felicidade. Senti necessidade de mostrar aquela foto rara a alguém: “veja, aqueles dois...”Mas, eles estão tão lindos assim, que o prazer daquela visão me bastava; uma luz amarelou seus perfis desceu pelo braço como uma carícia, depois chegou até o joelho. Mostrar por mostrar ou, quem sabe, para repartir aquele instante de beleza como quem reparte um doce, como sinal de estima e de simplicidade; em sinal de comunhão ou, talvez, para disfarçar o mal-estar com a vida atual.
Sua imagem tão viva era toda solta, de meus dois olhos, uma secreta palpitação. Via os seus joelhos dobrados, de lado, o gato imóvel no colo, na poltrona. Eu queria me aproximar; o sitiante, aquele felino estático e a sua rede avançavam, passando entre as cortinas cor de ferrugem que realçam meus cabelos e olhos. Mas, a barra do dia ainda era uma vaga música dos tempos de festa na roça, havia nuvens leves, espalhadas em várias direções, como se durante a noite o vento tivesse dançado ateu no ar. Depois, aos poucos, foi se acendendo um carmesim, de fumo de rolo, e sob ele o mar de concreto se fez quase verde. Imaginei o calor das pessoas na varanda, contando os causos de caçador e pescador, tomando café quente na caneca esmaltada, arrumando casamento e a vida alheia – do jeito de tribunal de júri – as mulheres na cozinha, batendo as panelas com o aroma agradável de comida caseira nas tardes de domingo. Não era um mal-estar de angústia dolorosa, era leve, quase suave. Como se eu tivesse, de repente, o sentimento vivo de que aquele momento luminoso era precário e fugaz. Dentro da cabeça parecia haver um torvelinho misturado à fragrância de erva verde fresca. E aquela rede vazia abria os braços esperando acolher outra vez os dois seres vivos.
Sobre o Autor
Rubens Shirassu Júnior: Designer artístico, jornalista e autor entre outros de Religar às Origens (Ensaios, 2003) e Oriente-se: Manual de Procedimentos no Japão, 1999.É o autor da coluna OLHO MÁGICO na VERDES TRIGOS.
Contato: jrrs@estadao.com.br
Veja também o "ORIENTE-SE: Manual de Procedimentos no Japão"
Edição Independente de Rubens Shirassu Júnior
Site do Livro: http://www.stetnet.com.br/orientese/
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