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Nem heróis nem crápulas
por Efraim Rodrigues
*
publicado em 14/05/2005.
A minha cidade, e provavelmente a sua também, tem uma história recheada de heróis. Em 1920 os pioneiros vieram para cá, no meio da floresta, com febre amarela, lama e pó, para desenvolver uma cidade de 470.000 habitantes. Plantaram café em meio a nada e em dez anos criaram uma economia pujante que crescia a passos de gigante. É o que contam.
O fato é que há algumas décadas Londrina era conhecida nacionalmente pelos seus prostíbulos para onde eram trazidas prostitutas de avião de todo resto do país. O quarteirão onde toda a coisa funcionava virou a moderna rodoviária. Ao chegar a Londrina, lembre que você está pisando solo “sagrado”. Os negócios eram fechados de inúmeras maneiras, e se muita gente ganhou dinheiro, também muita gente perdeu em maracutaias de diversas naturezas.
Nos anos 40, Londrina estava mais para Serra Pelada que para Eldorado. Mas a grande balela é afirmar que este povo todo veio para Londrina para criar uma nova cidade. Vieram para rapinar, se encher de dinheiro e voltar para sua terra natal. Uma versão moderna dos colonizadores Portugueses e Franceses. Eventualmente, mudaram de opinião e acabaram ficando.
E mesmo assim, quem puder que atire a primeira pedra nos pioneiros, agora respeitáveis senhores idosos. Ainda hoje nos comportamos da mesma maneira, tanto com as coisas da natureza, como com todos os outros bens públicos.
Não é vergonhoso que uma pessoa precise sair de seu lugar de origem por não conseguir meios para viver lá, e que se mude para outro lugar, onde se veja obrigado a pensar em curto prazo para sobreviver. Sem problemas. Esta é a situação de muita gente até hoje. O grande problema é querer posar de visionário. A Companhia de Terras Norte do Paraná, que ocupou boa parte da região, por exemplo, não desejava fazer uma “reforma agrária” no norte do Paraná, como freqüentemente se ouve. Os bancos, que formavam o capital da CTNP, não eram diferentes do que são hoje. A Companhia veio para cá para fazer a mesma coisa que as Incorporadoras fazem com os condomínios na periferia da cidade nos dias de hoje. Compram terra barata, fazem o arruamento e vendem a preço de terreno. Não é heroísmo. É sobrevivência, exatamente como a minha ou a sua.
E antes que algum pioneiro, ou filho de pioneiro faça isto, eu mesmo vou continuar falando sobre os heróis atuais.
Quando a gente vê o navio japonês com o canhão apontado para a Baleia, e lá embaixo no mar revolto, um pontinho vermelho, um barco com o pessoal do Greenpeace, todos nós pensamos quão heróicas são estas pessoas, que estão dispostas a arriscar a própria vida por uma outra espécie, etc, etc.
Existe uma crise nos meios conservacionistas hoje, gerada pela ganância das ONGS em captar os recursos necessários para sua manutenção. Ao invés de fazer uma autocrítica em relação aos seus métodos, prosseguem passando uma imagem rósea para não comprometer os fluxos de capitais que as mantém viva. É o que diz o editorial deste mês do Conservation Biology, o periódico mais respeitado da área.
Muitas ONGS têm se entusiasmado com os ICDP, sigla em Inglês de Projeto Integrado de Conservação e Desenvolvimento. A idéia de fato é bela, mas as Instituições que historicamente trabalhavam com bichos e plantas detêm a experiência necessária para trabalhar com gente?
Outra pedra fundamental do conservacionismo mundial são os mapas com os hotspots, áreas com megadiversidade, em risco de iminente de destruição. Na superfície, para inglês ver, pode parecer que existe consenso em relação a este método de estabelecer prioridades. A comunidade científica não concorda. Mas afinal quem é a comunidade científica para lutar contra heróis gregos luzindo no alto da torre da fama?
Sobre o Autor
Efraim Rodrigues: Efraim Rodrigues, Ph.D. (efraim@efraim.com.br) é doutor pela Universidade de Harvard, Professor Adjunto de Recursos Naturais na Universidade Estadual de Londrina, Consultor do Programa Fodepal da FAO-ONU e Editor da Editora Planta, sem fins lucrativos.< ÚLTIMA PUBLICAÇÃO | TODAS | PRÓXIMA>
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