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A transgressão sutil
por Whisner Fraga
*
publicado em 13/01/2005.
Há em seus contos, muitas vezes com o fôlego de uma novela, um esmero no encadeamento das ações e idéias. A tensão é meticulosamente criada seguindo uma seqüência linear de acontecimentos, como num filme, resultado de sua estreita relação com o cinema. Chico é programador e crítico de cinema do Instituto Moreira Sales, parente espiritual de David Lynch, Lars von Trier e Alfred Hitchcock, como bem notou Nelson de Oliveira, na orelha do livro. Em sua prosa é nítida a influência da sétima arte.
Há duas vertentes na literatura contemporânea. A de viés clássico - que reproduz os paradigmas machadianos; e uma inclinada à transgressão – muitas vezes se perdendo na ingênua intenção de romper com os cânones. Firmar-se na primeira alternativa pode ser custoso e nem sempre com resultados favoráveis, porque sempre ronda o fantasma dos grandes escritores do passado. Já os pretensos transgressores, se de um lado adotam a solução fácil dos textos de ruptura formal e conceitual, como os representantes da Geração 90, por outro, deixam a desejar, pois esbarram num fenômeno comum às estréias apressadas: a falta de qualidade e coerência, o que, em última análise, resulta da ausência de experiência criativa, e até de leituras, dos novos. Com relação a essa segunda classe, apesar de beneficiária dos holofotes da grande mídia e das editoras de porte, só ao tempo caberá fazer sua triagem e ao filtro da qualidade poucos resistirão. Isso não é um vaticínio, mas uma constatação a partir do que temos visto, lido e ouvido.
Chico Lopes é tributário de uma literatura que não se apega a modismos nem se vale das benesses de uma crítica de mera homologação ou de amizade. É filho da grande literatura, e foi através de sua condição de leitor detido e consciente, que foi recolhendo a lição dos mestres. Este Dobras da noite é resultado de um permanente espírito crítico, que o fez curtir ao máximo seus contos. Nos nove textos, Chico constrói personagens fortes, marginalizadas, ambíguas, que certamente o marcarão como um dos grandes prosadores do Brasil deste novo século. Certa vez Luiz Vilela afirmou que um bom conto era aquele cuja história permanecia na memória do leitor. Ratificando a assertiva do contista mineiro, o texto O manco, que abre o volume, sem dúvida, deverá perdurar na mente dos que se debruçarem sobre a obra.
Utilizando a escuridão como alegoria e/ou pano de fundo para o paroxismo e a desesperança de seus protagonistas, Lopes elabora histórias pungentes, lastreando o ranço da realidade pelas sombras, por si mesmas marginalizadas, de tantas vidas à deriva. Da edênica Poços de Caldas, que outrora abrigou João do Rio, o paulista de Novo Horizonte ergue uma sólida base para a sua carreira de escritor, provando que, estando em Paris ou em Ituiutaba, é possível uma arte de qualidade e universal, desde que se tenha talento.
Sobre o Autor
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