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Mais saco cheio
por Efraim Rodrigues
*
publicado em 24/10/2004.
Seguindo nesta seqüência de catástrofes, eu vou fazer exatamente o contrário do que os meus mestres me ensinaram, e vou continuar com o assunto da semana passada, quando falamos sobre a relação entre ambiente, educação, e a semana do “saco cheio”. Não fizemos tanto sucesso quanto As Panteras, mas alguns telefonemas já são suficientes para animar o autor desta coluna para além da conta.
Um professor, seja ele universitário, de nível médio ou ciclo básico, não aparece do nada. Não se formam professores, ou qualquer outro trabalhador intelectual, como se faz pão na padaria. Sove a massa de madrugada, venda o pão de manhã. Os professores de daqui a 10 ou 20 anos, estão hoje nos bancos escolares. Estes profissionais começam a preparar o pão (ou o biscoito fino) que irão vender como profissionais, décadas antes dele estar pronto. Entre muitas outras coisas, este preparo envolve a sensibilização do profissional para a importância do seu trabalho. É aí que nos animamos demais. Os professores são tão doentiamente cônscios da importância do seu trabalho, que esquecem da necessidade de remuneração.
Semanas depois de me formar engenheiro agrônomo, eu estava em uma sala de aula da periferia de São Paulo, dando aulas de ciências para a quinta, sexta e sétima séries do ciclo básico. Possivelmente, eu não tive outra atividade de tanta relevância social, nem tenha sido tão displicente com a minha carreira como naquele tempo. As inúmeras instituições ligadas ao ensino contam com a subvenção dos professores para manter suas contas pagas, na forma dos salários pífios que pagam. É como se os professores assinassem um cheque antes de entrar em cada aula.
Na área ambiental, por exemplo, as ONGS já aprenderam que podem contar com a mão de obra barata de professores doutores. Elas ainda têm o desplante de chamar de “consultores” os escravos que usam para avaliar projetos, dar cursos e escrever artigos. Nenhum demérito com a causa das ONGS, legítimas em sua vasta maioria. As ONGS usam um instrumento de coação para contar com o trabalho escravo dos professores. Muitas delas têm grandes projetos em seu portfólio. Ao servir de mão de obra escrava, os ingênuos professores crêem que irão participar da divisão do bolo. Santa ingenuidade. As ONGS são “hippies” na hora de contratar profissionais, mas são yuppies da quinta avenida na hora de receber. Esta estória me lembra a personagem de um livro, Nefertite, que fez um ingênuo vender os pais por causa das promessas de delícias que ela faria com ele. Ele terminou sem pais e sem delícias. Os cursos de pedagogia devem incluir, além da sensibilização para a importância do trabalho do professor, um pouco de gerenciamento de carreira e planejamento estratégico.
Todas mensagens de dia dos professores que recebi vieram de não-professores. Só um não professor, ou ex-professor pode ter o desplante de escrever uma mensagem que passe por cima da questão de remuneração, para falar sobre as delícias da profissão em uma mistura de livro de auto-ajuda com novela mexicana.
Parecia que estavam falando sobre um hobby. Quando se fala em profissão, estamos falando em vender o único pão que se dispõe, e se a remuneração está ruim, a profissão está ruim. Não há aula possível quando o professor traz uma placa no pescoço dizendo “Eu sou um otário que trabalha por um salário menor do que qualquer um de vocês irá ganhar quando sair daqui”. A regra é válida para professores do ciclo básico, secundário e universitário. Seus alunos recém formados ganham mais do que eles. A menos, é claro, aqueles que resolvem seguir a profissão dos seus mestres. Estes ganham uma placa novinha em folha.
Não se pode admirar intelectualmente alguém que vende sua força de trabalho a preço de banana. Sem admiração não há educação e sem educação não há ambiente sadio.
Sobre o Autor
Efraim Rodrigues: Efraim Rodrigues, Ph.D. (efraim@efraim.com.br) é doutor pela Universidade de Harvard, Professor Adjunto de Recursos Naturais na Universidade Estadual de Londrina, Consultor do Programa Fodepal da FAO-ONU e Editor da Editora Planta, sem fins lucrativos.< ÚLTIMA PUBLICAÇÃO | TODAS | PRÓXIMA>
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