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Seria Ele Chinês?
por Leopoldo Viana Batista Júnior
*
publicado em 21/10/2004.
Mesmo enquanto adultos, ouviram dos mais velhos, mais crédulos, mais sábios, mais bobos e até de eclesiásticos, que Ele era brasileiro.
E, quando duvidavam, de logo perguntavam o porquê.
Uníssonas respostas: porque somente Ele sendo brasileiro para garantir que o nosso Brasil seja essa maravilha, abençoado pela ausência de guerras e calamidades, como terremotos, furacões e enchentes; formado por uma única nação que se comunica por um só idioma; habitado por um só povo, mestiço e, sobretudo, místico; gente calma, de alma cordata e lhana, incapaz de guerrear com outros povos; amante dos esportes, especialmente o das chuteiras; enfim, quem teria o atrevimento de imaginar que Ele não seria brasileiro frente tanto protecionismo e bons-bocados?
Pois é... Descobriram, tardiamente, que Ele não somente não é tupiniquim, como sequer é ocidental, por assim dizer.
Ele é mesmo Chinês. Suspeita-se que tenha olhos puxados e apertados e que more exatamente ali por cima - desculpem o trocadilho -, no céu da República da China, e deve ser parente bem próximo do bom Buda, pois, se olhado com um pouco mais de atenção e sem se levar em consideração propagandas contrárias ou enganosas dos EUA contra “papa-figos” chineses, e, ainda, sem qualquer medo de desagradar a quem quer que seja, inclusive ao sobrenatural, ver-se-á com meridiana clareza, por conseguinte, que Ele tem tratado seus parentes chineses muito, muito melhor do que aos brasileiros, que pensam dele filhos. Dúvida? Compare:
A China ocupa imenso território, quase todo agriculturável, o que já é um privilégio, e tem, hoje, bem mais de um bilhão de habitantes, conseguindo alimentar satisfatoriamente mais de cinco brasis ao mesmo tempo. Comparando-o aos países ocidentais, especialmente com o nosso, “em eterno desenvolvimento”, até mesmo seu índice de criminalidade chega a ser irrisório, talvez porque lá, diferente de cá, a família do indivíduo delinqüente pague, inclusive, as despesas com a bala que o encaminha ao etéreo.
Nação em franca modernização, a China possui alta tecnologia industrial e espetacular produção universitária, dominando desde as técnicas dos vôos espaciais às dos armamentos nucleares, tendo sido esta última forma de energia enfatizada para destinação aos campos mais diversos, especialmente o da medicina e, registre-se, sem nunca haver testado seus efeitos destruidores sobre quaisquer dos seus inimigos, potenciais ou não. E não se esqueça que inventaram a pólvora.
Não se encontra em guerra, desde quando unificada séculos atrás, exceção ao esbulho Tibetano na década de cinqüenta, pois que considera como seu aquele território, há muito. Coisas da sua milenar cultura. Suas calamidades naturais bem que poderiam ser maiores que as brasileiras, mas não o são. É auto-suficiente em petróleo, minérios de ferro e gás, aliás, é auto-suficiente em quase toda matéria-prima necessária ao moderno, inclusive em água potável.
Pois bem, Ele, como imaginado, só pode ser chinês! Aliás, é chinês! Talvez o Brasil – vá-lá-que-seja – tenha algum parentesco com Ele, porém, se for esse o caso, é ele, o parentesco, muito, mas muito longínquo, e todo esse barulho não passa de qué-ré-qué-qué e ufanismo.
É que a massa satisfatoriamente ignorante, que compõe a grande maioria do nosso povo, aprova a resposta de que Ele é brasileiro como forma de acalentar seus eternos sonhos de melhores dias, ou aprecia ouvi-la, pois somente assim justificar-se-ia, perante essa mesma massa, nossa imensa miséria. Penso que seja a situação, à luz da sua ignorância, muito parecida com o tempo em que os nossos brasileiros silvícolas desconheciam astrologia e acreditavam, inocentemente, em Guaracy e Jacy.
Pois bem, parece ser de fácil explicação na via do sobrenatural, ou em razão do irremediável fado dos sonhadores eternos, até mesmo os eruditos, que prefere o povão essa suposição a ter que enfrentar a realidade, a difícil realidade, ou mesmo se contrapor ao responsável pelas demagogias e hipocrisias públicas, posto que estariam justificadas, de parte a parte, as omissões destes, no reclamar, além de suas ações, no trato das misérias e violências, retratos mais que verdadeiros da quase secessão corrente, diante das deflagradas e absolutamente ativas feridas sociais purulentas e demonstrativas das violências, escancaradas diariamente em redes de televisão.
Unicamente assim, negando a brasilidade Dele, quem sabe, poderiam ser justificados os altos índices de mortalidade infantil em todas as regiões do País, especialmente no Norte e Nordeste, os enormes índices de mortes no trânsito, os gigantescos índices de desvios de dinheiros públicos e alarmantes índices de pobreza, atestados que são da extremada desproporcionalidade entre esbranquiçados e pardos, muito ricos e muito pobres, urbanos e campesinos, governo e “resto” da população. Seria um querer Dele, estaria escrito, restaria a esse mesmo povo apenas o sofrer.
Dizem que se sentem mais confortáveis em pensar assim. Bom, que seja. Menos mal. Preocupava-me mais pensar que Ele fosse mesmo um galego Americano do Norte, como sei têm certeza, os alienados habitantes daquele país aterrorizador e belicista, pois quem negaria que Ele estaria, de certa forma, a justificar e aceitar as invasões, matanças e carnificinas que vêm empreendendo os tais americanos pelo mundo afora, porque, também, lembremo-nos, brasileiro mesmo ele não é não, basta simples olhadela ao nosso arredor.
Todavia, resta um alento para os insistentemente mais crédulos, pois foi inegável que Ele estava na arquibancada do espetacular autódromo chinês sede do GP de F1 da China, ah isso estava, e que torcia pelo Rubinho, torcia. Somente não sentiu quem não quis sentir, a exemplo de não ver apenas quem não quer ver a paulatina e silenciosa morte do estado de direito no Brasil, vilipendiado vagarosa, mas regularmente. Quem sabe, decisivamente, não ficaremos mais irmanados com a própria China, pois que lá esse tal estado de direito, já há muito, foi enterrado, não obstante sua economia pujante.
Aprenda-se mandarim.
Sobre o Autor
Leopoldo Viana Batista Júnior: Cronista.Autor do Livro: Estrada de Barro para Ladeira de Pedra.
Advogado da CAIXA em João Pessoa/PB.
Professor Universitário e Ex-Conselheiro Estadual da OAB/PB.
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