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A Arte da Chutometria
por Tom Coelho
*
publicado em 05/10/2004.
“Ninguém come macroeconomia”.
(John Maynard Keynes)
(John Maynard Keynes)
Tecer considerações sobre o cenário econômico brasileiro é um exercício curioso, praticado com prazer pela maioria daqueles que atuam no âmbito da Economia. Curioso e inútil.
Há algumas décadas era efetivamente plausível fazer projeções. Você traçava um cenário otimista, um neutro e um pessimista baseado nos ambientes externo e interno.
Até o fim dos anos 80, o ambiente externo era influenciado basicamente pela iminência de uma guerra mundial patrocinada pelo conflito EUA-URSS. Havia também o risco de um novo choque do petróleo. Lastreado nestes aspectos, os tais cenários poderiam variar entre favorável e desfavorável. Não era um exercício macroeconômico, mas geopolítico.
Quanto ao ambiente interno, vivíamos em um país política e economicamente fechado, cujo hermetismo somente era afetado ocasionalmente pelas chuvas ou pela saúva. Após 1982, vieram as crises da dívida externa e inflacionária, dificultando sobremaneira o planejamento tanto no setor público quanto no privado.
Os anos 90 trouxeram a chamada Nova Ordem Mundial. Crash da Bolsa de Nova Iorque em 1987, queda do Muro de Berlim em 1989, derrocada dos regimes comunistas, avanço da Internet, ditadura das comunicações. Globalização. O mundo interligado. Nunca a Teoria do Caos, o Butterfly Effect, mostrou-se tão presente.
Um vírus abate a saúde na Ásia e todo o mundo é economicamente contagiado. Os conflitos políticos na Venezuela ou no Oriente Médio afetam a cotação do petróleo. O terrorismo é promovido de coadjuvante a protagonista.
Talvez agora você compreenda, leitor, porque digo que os exercícios de projeção de cenários são inúteis. E, estatisticamente, posso comprovar-lhe esta inutilidade. Ao que me conste, nenhum, absolutamente nenhum economista ou empresa de consultoria econômica acertou sistematicamente a cotação do dólar para 31 de dezembro, a variação do PIB ou a taxa de desemprego nos últimos anos. A crise da Rússia em setembro de 1998 e a teimosia de Gustavo Franco não foram suficientes para se prever a maxidesvalorização cambial de janeiro de 1999. Presentemente, diante da ortodoxia imposta pelo Ministro Palocci, ninguém esperava um avanço do PIB, do saldo da balança comercial e a redução do desemprego observados recentemente.
De qualquer forma, se desejam números, posso apresentá-los. Quem me acompanha de perto, sabe quais eram minhas impressões no início deste ano. Minha expectativa era para um crescimento do PIB de 4,5%, inflação de 7,5%, dólar cotado a R$ 3,07 e balança comercial com saldo de US$ 31 bilhões. Para 2005, PIB crescendo 5,5%, inflação de 7%, dólar a R$ 3,22 e balança com saldo de US$ 39 bilhões. Assim mesmo, com intervalos de meio ponto percentual, sem a pedante precisão de décimos percentuais propalada por ex-ministros de Estado e ex-presidentes do Banco Central.
Se me perguntarem de onde tiro os números, direi sem constrangimento: chutometria. É claro que há fatores como dados estatísticos (séries históricas, análises de regressão, cálculos econométricos), estudos setoriais, informação e conhecimento processados que garantem um mínimo de cientificidade aos números. Mas, no fundo, não passa de aposta pelos motivos que expus. Porque basta um evento novo e contundente em alguma parte do mundo para alterar todas as variáveis relevantes. Apenas isso.
Por isso, a você que corajosamente atua como empresário ou executivo neste país, minha sugestão: cuide de seu negócio e releve tudo o mais. A viabilidade e o crescimento sustentável do empreendimento que você dirige estão relacionados à qualidade de seu produto ou serviço, ao atendimento que presta aos seus clientes, à harmonia cultivada em seu ambiente de trabalho, ao cuidado com os custos fixos, à correta formação do preço de venda, e à busca do lucro com aprimoramento.
Não quero, com isso, fazer apologia à ineficácia do trabalho de planejamento e de projeção de cenários. Ao contrário, são importantes e desejáveis para se evitar surpresas durante a caminhada. Afinal, se você estiver voando e a biruta indicar mudança na trajetória do vento, não necessariamente você irá cair, mas poderá ajustar seus instrumentos para manter o curso.
A Economia estará sempre aquecida para aqueles que têm bons produtos, praticam Marketing adequado e sabem identificar e respeitar seus clientes.
Qualquer outra coisa é conversa de botequim, papo-furado, devaneios ou... chutometria!
Sobre o Autor
Tom Coelho: Tom Coelho, com graduação em Economia pela FEA/USP, Publicidade pela ESPM/SP e especialização em Marketing pela MMS/SP e em Qualidade de Vida no Trabalho pela FIA/USP, é empresário, consultor, escritor e palestrante. Diretor da Infinity Consulting, Diretor do SIMB (Sindicato das Indústrias de Brinquedo do Estado de São Paulo), vinculado a ABRINQ (Associação Brasileira dos Fabricantes de Brinquedos) e Membro Executivo do NJE (Núcleo de Jovens Empreendedores), vinculado a FIESP (Federação das Indústrias do Estado de São Paulo).Visite: www.tomcoelho.com.br
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