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[Ambiente por Inteiro] Se lixando para as latas, vidrado nas garrafas

por Efraim Rodrigues *
publicado em 26/09/2004.

Quando eu era pequeno, tomar cerveja em lata era um luxo para poucos. Eu me lembro do esforço para amassar uma lata daquelas. Eu tinha cinco anos, e as latas eram de aço. Lá pela minha adolescência, começaram a usar latas de alumínio. Aí ficou fácil. Eu cresci, e as latas ficaram mais frágeis.

Já na faculdade, as latas voltaram a ser alvo da minha fúria ambientalista. Para produzir as malditas latas de alumínio, foi construída a hidrelétrica mais degradadora e ineficiente deste país: Balbina.

A substituição da antiga garrafa de vidro, reutilizável, pelo alumínio, reciclável, representou um avanço só para a luxúria dos 10% do Brasil que faz regime. Para os 90% que passam fome, tanto faz quanto tanto fez.

As firmas que produzem latas de alumínio alegam que a reciclagem é extremamente eficiente em relação a produção de alumínio "novo".
Veja os dados:

A RECICLAGEM DE 20 LATAS DE ALUMÍNIO CONSOME A MESMA ENERGIA QUE A PRODUÇÃO DE UMA LATA NOVA

CADA LATA RECICLADA, ECONOMIZA ENERGIA ELÉTRICA SUFICIENTE PARA UMA TV POR TRÊS HORAS

Colocado deste jeito, você pode se sentir o amiguinho do planeta porque recicla sua lata de alumínio. Reciclar é sempre positivo, mas neste caso existe uma solução mais eficiente, que é a reutilização. A boa e velha garrafa de vidro não precisa ser moída, enfardada, limpa derretida, moldada e pintada. Lavou, tá novo.

Todos os sites de reciclagem na INTERNET falam sobre a economia de energia de se reciclar alumínio, comparada com a produção a partir da Bauxita. Bull shit de americano, ou diríamos verdade parcial, para evitar a vulgaridade.

Na verdade, toda esta preocupação com a reciclagem do alumínio, é porque ela é economicamente lucrativa, tanto na conta da luz, quanto no marketing ambiental. A reciclagem de alumínio faz ciclar 80 bilhões de dólares/ano no Brasil. E ainda permite uma propagandinha ambiental, que não dói.

A pergunta que eu realmente quero fazer é:

LAVAR UMA GARRAFA CONSOME MAIS ENERGIA DO QUE DERRETER DUAS LATAS ?

Uma campanha destas teria dois inimigos: O cidadão de segunda categoria, que não quer saber de nada, ele quer é comprar a lata de cerveja e imaginar que está colocando em sua boca não o alumínio que ele comprou, mas o silicone da propaganda. E em segundo lugar, as companhias que lucram com esta atividade.

Uma outra balela, e das boas, é a geração de empregos. Eu quero ver qual dos executivos de companhias de cerveja que gostaria de ver seu filho trabalhando como catador de lata. E algumas firmas ainda tem a pachorra de falar em empregos para mão de obra QUALIFICADA!

O Brasil fala com orgulho que recicla 80 % das latas. É melhor do que poderia ser se jogássemos tudo fora, mas é muito pior do a reutilização do vidro.

Existe um aspecto tétrico na nossa eficiência na reciclagem das latas. Ela só é possível porque conta com um exército de crianças. A nossa infância e juventude está subsidiando, com seu tempo e dedicação, a reciclagem e o lucro das grandes produtoras de vasilhames.
Há anos atrás, eu estava no Nordeste tomando uma cerveja na praia (vida de ambientalista não é só mato e pernilongo), quando eu vi uma criança fixada em mim. Eu só fui entender o que se passava quando eu terminei a cerveja e ela me pediu a latinha.

Eu quero crer que o nosso país tem criatividade e inteligência para inventar atividades mais promissoras para suas crianças.

MAIS DO QUE RECICLAR LATAS,
USE GARRAFAS !

Sobre o Autor

Efraim Rodrigues: Efraim Rodrigues, Ph.D. (efraim@efraim.com.br) é doutor pela Universidade de Harvard, Professor Adjunto de Recursos Naturais na Universidade Estadual de Londrina, Consultor do Programa Fodepal da FAO-ONU e Editor da Editora Planta, sem fins lucrativos.

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