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NA CONTRAMÃO E NA BANGUELA, COM A LÍNGUA

por Paschoal Motta *
publicado em 11/08/2004.

Já se tornou corriqueiro ler ou escutar, nos meios de comunicação, um enunciado com graves impropriedades na Língua Portuguesa. Uma balbúrdia: se correto gramaticalmente, vem disparatado, com significação truncada, duvidosa, insossa, e/ou mal articulado verbalmente; se coloquial, ridículo e fora de ambiente. A incompetência generalizada está pegando firme na Língua de Camões aqui no Brasil! Nada justifica tanta agressão contra o ainda bonito Português.

Não falemos aqui das inserções vocabulares e frasais alienígenas, no geral inoportunas e humilhantes. E já afetam a sintaxe, onde reside o maior desacerto. Nada de xenofobismos, mas até quando carregar esse fardo secular de colonialismo cultural subserviente?

Um idioma, ser pulsante, se transforma, naturalmente, na sociedade que o pratica. Mas, esse fator pode não ser bem compreendido e realizado por muitos que têm no Vernáculo sua ferramenta principal de ofício. É ler, escutar e se arrepiar. Modo geral, confirma-se que esse profissional nem terminou o Primário, e se arvora em comunicador, com uma salada mista, e intragável, de pronomes de tratamento, concordâncias estranhas, pronúncias esdrúxulas, ritmos dissonantes e o mais. E o vocabulário ortográfico legalizado? Esse é confuso, um mal necessário! E quem o conhece e pratica sem grande dificuldade?

Ditadura gramatical, nem pensar, mas compreender que o testemunho de cidadania duma sociedade começa no respeito de cada utente à Língua Nacional, com amor e prática sensata no aproveitamento consciente de suas modalidades, potencialidades e possibilidades em diferentes tempos, ocasiões e lugares. Não é isso o constatado: em áreas profissionais de manifestação falada e escrita, um descalabro se desenvolve, como jamais: desde o Governo Federal a estabelecimentos de ensino, professores (até de Língua Portuguesa), publicitários, jornalistas, editores, tradutores, escritores, executivos, advogados, reitores de universidade. Atropelam e desfiguram a indefesa e última Flor do Lácio! Estressam os mais vividos! Desiludem os esperançosos renitentes! Prejudicam seriamente a mocidade em formação!
O Português é herança e patrimônio cultural; representa nossos modos de ser, estar, agir e sentir; e nos distingue no concerto das nações. Mais ainda: exige-nos rigorosa e serena consciência crítica, respeito e responsabilidade para com as gerações passadas, atuais e futuras.

Com veiculação quase instantânea de novidades, e insistentemente deterioradas, esses profissionais degradam a Língua de modo rápido e irreversível. Testemunhamos inusitada transição das linguagens para o banal, para o pobre, para o chão, para o grosseiro, para o palavroso inexpressivo, por displicência e ignorância de quem devia ser responsável por melhor utilização da Língua com que se apresenta.

Corrompendo nossa consciência brasileira no trato diário com a Língua Mãe, perdemos a liberdade pessoal e coletiva, além da emoção, que nos caracteriza e transfigura nas expressões artísticas populares e eruditas.

Nenhum sistema lingüístico vivo é imune a influências externas e transformações internas, mas viajamos com a Língua Portuguesa em velocidade muito acima do permitido pelo código, morro abaixo, na contramão e na banguela.

Sobre o Autor

Paschoal Motta: Paschoal Motta é professor, jornalista, editor, escritor de ficção e poesia.

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