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Overdose de amor

por Noga Lubicz Sklar *
publicado em 14/12/2008.

Vamos combinar que esse mundinho exibido das celebridades não me interessa nem um pouco, costumo passar batida. Mas, gente, esse caso terrível da morte por overdose do ex-PM, ex-marido, ex-amor e ex-corneador de Susana Vieira (nem sempre nessa ordem) me pegou de jeito, sabem como é: pequenos detalhes desses dois eu também já vivi.

Marido que trai? Já tive. Namorada de marido ao telefone de madrugada pra dizer que o tal, drogado e alterado no meio da rua (e bem distante do seu convívio oneroso), ameaça se matar? Já tive também, aliás, fica até parecendo normal essa história de amante de marido confessando - para a esposa (o)fendida - sua ilícita relação, ops, peraí, confessando não: usurpando mesmo, ai, gente, vocês nem imaginam como eu já sofri com isso... há tantos anos atrás e no entanto. Eu não me esqueço. Essa mágoa imprimida - por intrometidas não-solicitadas chamadas noturnas - não se fecha em meu coração jamais, ih, ficou brega. Mas a dor que a gente sente, meus amigos, de brega não tem nada: é bem pungente e real.

Outro assunto doloroso é o modus operandi de quem não dá conta da própria vida e a subsidia com drogas, abuso de álcool e outros voluntários venenos similares, o que me lembra o incômodo de eu, um dia, ter me considerado uma alcoólatra, pois é, por conta de parca meia dúzia de noites bêbadas - ao calor de alguma ausência afetiva - no antigo Crepúsculo de Cubatão, imaginem. Hoje em dia, quem diria: sou tão bem-comportadinha, na base de uma-taça-por-dia-e-basta, que arrasta ao território da ilusão perdida a minha pretensão falida à boemia literária, vocês sabem, quem nasceu pra Noga não chega nunca a Bukowski, bem, hum: não me rende prêmio mas franqueia a redenção, seria a arte meesmo mais importante que a vida? Ou a miséria: essencial para o artista?

O caso é que no caso em questão nem mesmo se trata da angústia existencial da arte, é tudo fraqueza mesmo, falta absoluta de tratamento adequado ou mais ricos mergulhos ocasionais na própria mente, mas a pena do amor fracassado é exatamente a mesma, o que me leva a "questionar a relação", não a minha, ou a sua aí - você que me lê -, mas a relação conjugal em si, pobre Susana. A gente desencana, se entrega, se apaixona, só pra sentir pouco mais à frente a óbvia repreensão do auto-engano? É isso? A quanto dispõe-se o encanto, pela sempre efêmera emoção de um grande amor? A gente entende? Perdoa? Apóia? Oh, Deus: até quando? Até que ponto? Me degladio com isso diariamente myself, na gangorra sagrada do compromisso assumido: um dia ama e no outro odeia; um dia beija no outro agride; um dia se abraça no outro se aparta e, cá entre nós, às vezes fica mesmo difícil definir o tom certo pra cada dia que passa, ô vida. Ô miséria. Ô amor bandido: bom com ele pior com ele, mais ou menos isso.

Penso na Susana e no que ela enfrentou calada, por trás das telas arrombadas dos paparazzi à cata de notícias; pior: ao que ela se submeteu na condição de um vexame público, me desculpem, corretos, mas penso do que ela escapou (por muito pouco) e angaria a minha simpatia, sim, e empatia também.

Por enquanto aqui em casa o amor tem vencido, o fervor, a tensão constante do compromisso a ser mantido, afinal de contas, o que é um casamento? Deve ser mais, imagino, que um pedaço de papel guardado, um incandescente atrito genital aplacado, algo que se construa, a que a gente se habitua e eventualmente se conclui num lar: uma ilusão bonita. No nosso caso aqui em casa, ah, relevem que a emoção anda em alta por conta do espaço sonhado da sala, todo mundo sabe que o projeto ideal imaginado ameaça qualquer paz conjugal, mais ainda quando a paz é tão rara, mas ih, atravessei o tom que o assunto desta crônica é bem mais sério.

Vai pra Susana Vieira o meu abraço, e, praquela outra - apesar do mau passo -, hum, também. Ninguém merece esta dor destrutiva de um amor tão doente, ou agora, pior: morto e já enterrado. Que ele descanse, como disse a Susana.

Sobre o Autor

Noga Lubicz Sklar: Noga Lubicz Sklar é escritora. Graduou-se como arquiteta e foi designer de jóias, móveis e objetos; desde 2004 se dedica exclusivamente à literatura. Hierosgamos - Diário de uma Sedução, lançado na FLIP 2007 pela Giz Editorial, é seu segundo livro publicado e seu primeiro romance. Tem vários artigos publicados nas áreas de culinária e comportamento. Atualmente Noga se dedica à crônica do cotidiano escrevendo diariamente em seu blog.

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