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A conta ambiental dos Finados

por Efraim Rodrigues *
publicado em 02/11/2007.

"O homem está destruindo a Terra!" esta meia verdade é o chavão mais batido nas aulas do ensino básico. Muitos homens, não todos, destroem e aliás, contam também com a ajuda de muitas mulheres.

Alguns homens e algumas mulheres não param de poluir nem quando morrem. A mesma tradição cultural que transformou os ciclos fechados, sustentáveis e sovinas da natureza, em ciclos abertos e perdulários da modernidade, transformou os seres humanos em matéria não reciclável. Da mesma forma que guardar as moedas em um porquinho de louça pára a economia, não reciclar os nutrientes dos corpos, causa problemas para a natureza.

Quando um animal de dezenas de kg morre, se inicia um processo interno de produção de metano, que após algumas semanas, irá romper este corpo. Depois disto, será produzido um líquido, o necro-chorume. Seu potencial poluidor é tão grande, que Lucrecia Borgia matava seus amantes em minutos com gotas dele. De 7 a 12 litros desta substância infiltram no solo por cada corpo em decomposição. O mesmo problema de poluição do lençol que existe em cemitérios, existe em lixões. Exceto pelo fato que temos menos problemas para implantar em cemitérios as mesmas obras de engenharia necessárias para transformar lixões em aterros sanitários.

Cemitérios se assemelham a lixões também na sua relação com as pessoas. Ninguém quer um cemitério ao lado de casa.

Esta "riqueza" nutricional dos cemitérios também causa problemas de proliferação de insetos, ainda piorada pela proximidade entre cemitérios e cidades. Aliás, quase acabou com o namoro de um grande amigo, que estava em um carro aberto ao lado do cemitério, quando foram visitados por uma revoada de baratas muito bem nutridas.

O Matemático Tom Ramsey calcula que ao redor de 96 bilhões de pessoas já viveram sobre a Terra. Imagine como estaria o planeta se cada uma destas pessoas tivesse direito a uma lápide de 2 x 1. Será correto subtrair espaço dos vivos para os mortos poluírem?

A primeira cena do filme Waterworld mostra um corpo sendo colocado em um biodigestor, para gerar gás para uma ilha. Seu intento é causar repugnância, mostrando a que ponto poderemos ir, pela falta de terras. Minha visão é oposta. O morto está dando sua última contribuição para melhorar a vida dos que ficaram.

É tempo de revermos ritos e tradições com os entes queridos que se foram, para que a dor de suas mortes não se some às de nossas vidas.

Sobre o Autor

Efraim Rodrigues: Efraim Rodrigues, Ph.D. (efraim@efraim.com.br) é doutor pela Universidade de Harvard, Professor Adjunto de Recursos Naturais na Universidade Estadual de Londrina, Consultor do Programa Fodepal da FAO-ONU e Editor da Editora Planta, sem fins lucrativos.

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