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A CRÔNICA E SEUS TEMAS

por T.M. Castro *
publicado em 31/10/2007.

O argentino Borges disse certa vez que só escrevemos sobre experiências que imaginamos possíveis de acontecer e que tais fenômenos são mui pouco originais, isto é, o campo que nos é oferecido éexíguo, daí escrevermos sobre poucas coisas, se pretendemos originalidade.

Eis, então, que só escrevemos sobre o que é sempre possível. Para fugir deste rame-rame, deveríamos, penso, buscar material no que existe fora do comezinho sempre. Dentro do sempre há um tudo descrito ou seráque ainda há algo a ser descerrado?

Vejamos: - O bizarro, Frankenstein ou Dr. Jekyll e Mr.Hyde, o Superhomem, o sobrenatural, Drácula, tudo isso é, de fato, imaginável, por isso da esfera do sempre. Até Harry Potter, assim como o rei Arthur, são coisas paralelas da esfera do sempre, de igual sorte o Pinduca e o Mr. Simpson. Do bizarro, passando pelo comum, indo ao fantástico, tudo já foi abordado pela pena humana. E se você atualizar este discurso, verá que, considerando a atualidade do sistema binário com suas máquinas, o computador tal uma delas, tudo jáfoi explorado, descrito, decantado, negado, endeusado, avacalhado não mais por uma pena, mas por uma coisa que nem batizada no vernáculo foi (pelo menos não de meu saber), digo:o mouse. Concluo, com indignação, que chegamos tarde, que tudo já foi dito à moda antiga e àmoderna. Nada mais parece restar para ser explorado pelos que se dizem escribas, pelos que assim os temos.

Nada mais comprovador dessa inanição temática, dessa afasia narradora, do que os temas abordados hodiernamente pelos que se dedicam às Ciências Sociais. Que mais se tem a dizer sobre palafitas e mocambos? que mais se tem a dizer sobre maracatus, sambas, xotes e outros manifestações do gênero? Depois da ridícula dança dos pataxós, difundidissíma pela televisão pós o trágico episódio de Brasília, quando se viu um bando de pretensos índios, ou ex-indios, ou índios motoristas, paraquedistas, iatistas, isto é, brancos como nós (civilizados) dançando ao som de paupérrimas canções da igreja católica, que mais se tem a dizer sobre cultura indígena? Ainda em rota de divagação, tome-se dos boletins doutrinários jurídicos: só tratam de antigas pizimbas ente o Ministério Público e a Polícia Judiciária, tipo, quem processa quem, quem inicia o inquérito policial , enfim, quem manda mais - que mais se tem a dizer na esfera das letras jurídicas? Não diria nada, diria sempre, caíram no esgotado mundo do sempre... tudo já foi escarafunchado.

Bem, restam os territórios do Nada e do Eterno...

* * *

Apelemos, então, para o Nada. Imaginemos o Nada e enlouqueçamos. Impossível imaginar algo antes do sempre. Vejamos bem, há um Nada e acontece, de repente, a explosão do sempre. Loucura total. Diziam os filósofos dapatrística, ex nihilo, nihil do nada, o nada o que implicará admitir haveria um quê entre o Nada e o sempre. Seria o Quê maiúsculo ou um quezinho qualquer. Ao começar com tal raciocínio, você já se embrenhou no caminho sem volta da elucubração doentia da ontologia, da origem do ser; daí, você poderá até mesmo engrandecer o problema, procurando ver as dependências entre o Ser e o Nada ou entre o Ser e o Tempo, e você, um dia se verá literalmente perdido, embora a humanidade o considere um gênio. Não importa, você acabou atirando em direção ao metasempre, mas sua bala do sempre não terá saído, pois tais temas são de fato recorrentes na esfera do coitado e humano sempre.

Resta-nos apelar para o Eterno...

Deus meu, o Eterno não nos é nem de leve ofertado, sequer em perspectiva! Alguns não no admitem, como o decantado Borges, que o tem como criação humana. Para o argentino, a eternidade é tema cultural. Outros, como o beato da esquina, para não irmos de chofre à gestatória para buscar na fonte conhecimentos sobre o tema, já o têm como a única realidade. Admitamos que assim seja. Vamos, então discorrer sobre o Eterno. De minha parte, vou me concentrar e anotar o que me ocorre em termos de idéia.

* * *

Tomei de Teresa Dávila e só encontrei humanos tremores, suores, estremecimentos, prazeres ou dores, visões, ou seja, sensação qualquer, humana coisa é, logo está na esfera do sempre, que é a esfera do Tempo, e não na esfera do Eterno. Tomei de João da Cruz, dos doutos beatos o mais representativo em temas teologais. Que belo o seu poema sobre a alma e sua busca ao Altíssimo! - vejamos uma só e exemplificadora estrofe do celebérrimo Canções da Alma:

Em uma noite escura
De amor em vivas ânsias inflamada,
Oh! Ditosa ventura!
Saí sem ser notada,
Já minha casa estando sossegada.


Vemos o poeta santo empolgar temas que não seriam de fato palpáveis como o são as coisas do cotidiano, as coisas do sempre. Há, parece, uma abordagem à alma, uma migração, uma ordem estabelecida. Mas, se tais temas (seriam temas? tema é coisa do cotidiano) , se tais realidades ( a realidade, parece-me poder ser ente do campo do Eterno) são da esfera do Eterno, não teve ele outra escapatória senão a de usar de maquinaria do sempre, as metáforas, noite escura, casa etc.

Desisto. No momento em que se invoca o Eterno, em que se tangencia algo como sendo do Eterno, se o transpuser para a esfera do palpável, do discutível, (eu digo isso, você retruca), do trocável (eu digo que é assim, você diz que éassado, e eu me convenço), enfim, para o fenômeno literário, surge o instável, o mutável, o cambiante, o temporal, ou seja, a esfera das coisas sempre discutidas, sempre pensadas, sempre ditas, aí a esfera do sempre, a esfera do tempo, longe da esfera do Eterno, claro. E, bem a propósito, teria o Eterno uma esfera ?

Perdoe-me eventual paciente leitor por esta minha pretensa-pseudo filosofagem em torno do escrever e seus temas. É que, colaborador episódico do sítio literário Verdes Trigos, vi-me, de repente, de mouse em punho e nada desingular no cotidiano me ocorreu para narrar, pois pelejava comigo mesmo em torno de dois episódios distintos, mas concomitantes e interligados, que aconteceram no mundo literário de Brasília, DF.

Um, o conto "Hóspedes do vento", de Chico Lopes, escritor e também colaborador de Verdes Trigos; o outro, o artigo "Escrever para quem?", de Pedro Paulo Rezende, escritor e jornalista da equipe do Correio Braziliense, ambos publicados no encarte literário Pensar, do referido periódico, sábado, dia 27 de outubro.

Ora, o bem lançado e preocupante artigo de Rezende deixa-nos perplexos diante da constatação da anorexia literária do brasileiro, de sua inópia cultural, de sua pouca disposição para a leitura. O artigo comenta recém-lançado livro sobre a prática da leitura em nosso país e é rico em invocações a teses e argumentos históricos. Ao lê-lo, nos entristecemos, pois restamos convencidos que, se os bons escritores não são prestigiados, imaginemosos que apenas rabiscam para os mais próximos, qual meu perfil: sequer pela família somos prestigiados, coisa que, de fato, lamento confirmar.

Entristece ainda o fato de que há muita coisa de primeiríssima linha chegando às livrarias com esplêndidas traduções e tais felizes incidentes, posto que mui diligentemente apregoados por Sérgio de Sá, do encarte do Correio Braziliense, mas, mofarão nas prateleiras?

Ocorre-me uma cena européia. Paro, penso e comparo. Constato que o Brasil não dispõe de frios invernos nem de metrôs com longos percursos. Os ditos ingredientes são positivamente fatais para a fabricação de leitores e disso a Argentina é material probante. Por outro lado, nossos verdes mares, nossos verões de biquínis cavadões, nosso trios elétricos, nossos carnavais de três meses... que turista levaria Os irmãos Karamazov para as férias em Salvador, Bahia ?

Em meio a meus tristes pensamentos, já nos licores pós -´prândio de sábado, vejo que o Pensar deambula sobre as poltronas de minha sala. Um conviva, após folhear o jornal, comentou haver lido o conto do sábado anterior, também de Chico Lopes, que seria sobre um raptus, uma explosão amorosa e sua realização ante uma mera janela fechada. Já no conto de hoje, diz o conviva, "Prendeu-me a atenção ver o que acontecia, pois... " Bem, meu conviva usou a palavra mágica: prender. Parece ser este um dado importante a ser considerado pelos críticos.

Chico Lopes, que não conheço pessoalmente e, portanto, não sou dele amigo nem cogente tributário de encômios, com uma maneira mui gentil e refinada, sem apelos escatológicos muito em moda em contos e crônicas atualmente - usa do prender, fino artifício, sem demonstrar estrondos, "efeitos especiais" abomináveis em linguagem escrita. Simples, pouco a pouco, uma deixa aqui, uma pitada ali, e um final intrigante a coroar e provocar discussões. Uns gostariam de um fim assim, outros concordam com o proposto... Mas há literatura, pois cumpriu-se o seu, dela, propósito: a reescrita da escrita, a discussão, a leitura como fato social e não apenas como prática individual, e esplende o contaminador barato, palavra chula a substituir a contento o fenecido enlevo. Que seja o barato, contanto que com intensidade bastante para despertar o compartilhamento, a troca. Aí temos literatura e isso Chico Lopes, de fato, proporciona.

Invade-me uma sensação eureka: os romanções século XIX parece não terem mais um apelo significativo para certas camadas etárias, maioria nacional, mas os temas modernos que abundam no sempre, ou os temas do sempre com uma roupagem moderna (O passado, romance argentino recente que de súbito já virou filme de cinema), universais porque próximos de todos da aldeia, e que persigam aqueles ditames de Ítalo Calvino, Borges e outros, com poucas margens de erro, despertam o interesse de nossos contemporâneos, contanto que valham a pena, que saibam prender mais que aquele apelativo programa de... , bem, deixa pra lá...e que, ao mesmo tempo que prendem o leitor, carreguem a gota mágica do espraiar-se, do compartilhamento, coisa que só acontece se, em primeiro passo, prender o intérprete de imediato.

Eis a meu ver a palavra chave: prender.E nesse patamar a literatura é, em linguagem viniciana, eterna. E aqui indago, ainda que em tom provocante: Não seria isso a explicação do fenômeno Paulo Coelho ? Eu mesmo de tanto ouvir sobre seus temas, jálhe dei belas e longas folheadas.

SE nossos autores prendem o interesse e a atenção do brasileiro médio, é questão para a crítica literária; não cabe em crônica, cujo tema, desta feita, está antecipado no próprio título a ela conferido.

Ufa, parece que, finalmente, surgiu um tema. Ou melhor: não ter tema também é tema. Ou será que consegui um tema, mas resvalei da crônica?

Sobre o Autor

T.M. Castro: Temístocles Mendonça de Castro – é formado em Direito, lecionou em Faculdades, foi Promotor do Júri, Procurador de Justiça, Procurador do Cidadão, e hoje está aposentado. Vive entre Alexânia, GO, e Brasília, DF. Um texto seu já foi publicado no site messageinabotou, de Brasília.

Contato com o autor por email: temisbsb@terra.com.br

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