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Os sempre excluídos

por Manoel Hygino dos Santos *
publicado em 09/02/2007.

Já escrevi, alguma vez, sobre Coélet, ou seja, o livro bíblico do Eclesiastes, escrito em meados do século III antes de Cristo, tempo em que a Palestina era dominada pelo Império dos Ptolomeus, do Egito. É algo que se deve ler presentemente, para se comparar com a época em que vivemos.

Uma síntese está na própria contracapa do volume editado entre nós pela Paulus. Nele se descreve a dura realidade da absoluta maioria do povo esmagado pelos tributos devidos ao império, aos poderosos e aos a ele aliados ou subservientes, enquanto a maioria permanecia explorada pelos comerciantes estrangeiros, sem qualquer possibilidade de recuperar os seus direitos.

Assim se vê que, desde priscas e remotas eras, o homem foi espoliado, ofendido, humilhado, não se tendo evoluído suficientemente nestes mais de dois mil anos.
Lê-se, em 4,1-6: “Examinei, também, todas as explorações que se cometem debaixo do sol. Aí está a aflição dos explorados, e não há quem se solidarize com eles - ninguém se solidariza com eles, porque o poder está do lado dos exploradores”.

Nada tão claro. No Egito e na Palestina, escreve Ivo Storniolo, os poderosos da classe dirigente exploravam tanto os camponeses quanto os artesãos das aldeias. “Eles praticamente tinham o povo e o trabalho do povo na mão, e isso de duas formas: ou explorando diretamente, através do trabalho reduzido à escravidão, ou indiretamente, através do monopólio econômico, que também é detido por eles”.

Doloroso, ou revoltante, é que o pobre continuou mais do que pobre, porque excluído - a palavra pegou, entre nós - espezinhado, como um animal de categoria inferior. No Egito, no tempo de Nehemias, o povo que trabalhava clamava e reclamava: “Levantou-se uma grande queixa entre os homens do povo e suas mulheres contra seus irmãos, os judeus (não o povo, mas a classe detentora de meios de produção)”. Uns diziam: “Temos de empenhar nossos campos, vinhas e casas para recebermos trigo durante a penúria”.

Outros diziam: “Tivemos de tomar dinheiro emprestado, penhorando nossos campos e vinhas, para pagarmos o tributo do rei; ora, temos a mesma carne que nossos irmãos e nossos filhos são como os deles; no entanto, temos de entregar à escravidão nossos filhos e filhas; e há entre nossas filhas algumas que já são escravas! Não podemos fazer nada, porque nossos campos e nossas vinhas já pertencem a outros”.

“Trabalho e Felicidade: O livro do Eclesiastes”, de Ivo Stoniolo, ajuda a entender o tempo que a narrativa abrange, contribui para compreender a evolução do homem e dos costumes através das eras. Auxilia no conhecimento e na interpretação do que foi outrora o homem e no que presentemente é.
Stoniolo classifica o “Eclesiastes” como um livro sapiencial, um dos gêneros da literatura de Israel, ao lado do gênero histórico, legislativo, profético, poético e ficcional, todos presentes no Antigo Testamento.

O autor se sente no dever de fazer distinções:

A sabedoria constitui uma forma de conhecimento que há de ser entendida em sua peculiaridade, já que não pode nem deve ser confundida com qualquer outra forma de conhecimento. É diferente de erudição. Esta é um acúmulo de conhecimentos, em geral conseguido com auxílio de cursos, leituras, informações de diversos tipos.
Sabedoria diz respeito a um discernimento ou percepção profunda, só adquirida através da digestão, lenta ou rápida, da experiência da vida. Assim, o erudito pode não ser sábio, assim como o sábio pode não ser erudito.

Não é suficiente viver. É indispensável digerir o que se vive, remexer e esmiuçar o que se viveu, buscando o significado ou sentido das próprias experiências, entender que certas coisas, boas em si, não dão certo e o contrário também: por que certas coisas, apesar de julgadas boas, acabaram não dando certo?

Sobre o Autor

Manoel Hygino dos Santos: *Jornalista e escritor. Membro da Academia Mineira de Letras, cadeira n. 23.

Livros publicados:
Vozes da Terra , Ed. do Autor , Belo Horizonte , 1948 , Contos e Crônicas
Considerações sobre Hamlet , Ed. Imprensa Oficial de Minas Gerais , Belo Horizonte , 1965 , Ensaio Histórico – Literário
Rasputin – último ato da tragédia Romana , Ed. Júpiter , Belo Horizonte , 1970 , Ensaio
Governo e Comunicação , Ed. Imprensa Oficial , Belo Horizonte , 1971 , Monografia
Hippies – Protesto ou Modismo , Ed. Júpiter , Belo Horizonte , 1978
Antologia da Academia Montes-Clarense de Letras , Ed. Comunicação , Belo Horizonte , 1978 , Coordenação de Yvonne de Oliveira Silveira
Sangue em Jonestown, uma tragédia na Guiana , Ed. Júpiter , Belo Horizonte , 1979 , Ensaio
No rastro da Subversão , Ed. Faria , Belo Horizonte , 1991 , Ensaio
Darcy Ribeiro, o Ateu , Ed. Fumarc , Belo Horizonte , 1999 , Biografia
Notícias Via Postal , Ed. do Autor , Belo Horizonte , 2002 , Correspondências


E-mail: colunaMH@hojeemdia.com.br
Matéria originalmente publicada no Jornal "Hoje em Dia", Belo Horizonte/MG

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