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RESENHAS
Dentes ao Sol
Rubens Shirassu Júnior*
Quem é, afinal, Glauco Mattoso? Será um agitador cultural, humorista de plantão ou pornográfico? Fica difícil a definição para a maioria do público pelas influências do ensino tradicional, educação familiar, das religiões e meios de comunicação, que manipulam informações e, ao mesmo tempo, formam opiniões.
O autor que retoma a tradição porno-erótica e satírica que vem de Marcial, Gregório de Matos, Quevedo e Bocage, considerada pela crítica inferior à lírica, será verdade ou preconceito? Mas, não obstante tudo isso a poesia erótica de Glauco Mattoso é extremamente forte nos dois sentidos que esse adjetivo comporta: forte por ser grosseira, vulgar e aludir a situações escabrosas; mas também forte poeticamente, pois, pela extraordinária carga de cinismo e sinceridade, o texto toca fundo o leitor. Esse fascínio, em seus sonetos musicados que se traduz numa comunicabilidade quase imediata com o público, é que talvez o tenha mantido isolado e clandestino até hoje.
Agora, em Cavalo Dado: Sonetos Cariados, Coleção 100 (Sem) Letras, as personagens que ambientam a vida cultural encontram no verso glauquiano outra voz alta, que se soma aos grandes nomes de expressão nacional e da política internacional, como George Bush, Dráuzio Varella, Paulo Coelho, Antônîo Carlos Magalhães, Bill Gates, José Genoíno, José Dirceu, Gugu Liberato, entre outros. Seqüência natural dos recém-lançados Pegadas Noturnas: Dissonetos Barrockistas, Contos Familiares: Sonetos Requentados, este novo trabalho de Mattoso, expõe os dentes da tradição política e cultural de nosso país, no início deste século e de sua própria vida de libertino excêntrico, onanisticamente condenado ao isolamento pela cegueira. Seguindo somente a tradição métrica de Camões, maneja com perfeição, o que levou o crítico Leo Gilson Ribeiro a declarar que considera "excelente a técnica de sua versificação, inteligentes, ricos, variadíssimos, com pitadas de Baudelaire, um tempero de Rabelais e, um pouco de molho de Villon". São 101 sonetos, após a marca de mais de 300 compostos, evidentemente, sem se afastar da disciplina formal, incluindo episódios da vida pessoal mais biograficamente verídico do que o Manual do Pedólatra Amador, de 1986, onde a narrativa é parcialmente fantasiosa.
Da visão despojada de preconceitos com que o poeta paulistano ouve as vozes novas de seu tempo, aplicando-as corajosamente à realidade brasileira, com admirável precisão mete a língua nas chagas sociais de um país de aristocracia decadente, aliada a um clero igualmente corrupto, jungidos ambos a uma política interna e externa altamente devastadora nos dias de hoje: a arbitrariedade e o obscurantismo de seu tempo não são poupados por Mattoso, e a censura e o desprezo da grande imprensa, influenciada pelos modismos estrangeiros e da mídia, zelosamente, não divulga os seus textos, com argumentos, infelizmente, ainda familiares aos ouvidos modernos.
Sobre o Autor
Rubens Shirassu Júnior:
Designer artístico, jornalista e autor entre outros de Religar às Origens (Ensaios, 2003) e Oriente-se: Manual de Procedimentos no Japão, 1999.
É o autor da coluna OLHO MÁGICO na VERDES TRIGOS.
Contato: jrrs@estadao.com.br
Veja também o "ORIENTE-SE: Manual de Procedimentos no Japão"
Edição Independente de Rubens Shirassu Júnior
Site do Livro: http://www.stetnet.com.br/orientese/
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