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Coração com Sol

por Maria Cristina Castilho de Andrade *
publicado em 21/08/2005.

A mãe da menina é de aparência cinza. Alguns dizem da dificuldade de entrar em comunhão com ela. Não passa, pela rua, lentamente ou apressada; passa, simplesmente, em si mesma, no rumo de todos os dias. Como se não houvesse pessoas pela calçada. Como se alguns não estivessem nos portões. Como se carros não passassem por sua estrada.

Os filhos ficam em casa. Ela não pode. É necessário garantir o sustento. O local, onde a mãe da menina trabalha, é cinza. Separa sucata que homens, outras mulheres com histórias semelhantes à dela, adolescentes e crianças carregam, em suas carrocinhas, de lá para cá, de cá para lá. Nos acúmulos de garrafa, papel, ferro, papelão, encontram seu tesouro. Em dias de festa, existe, na mesa, tutu de feijão, costelinha de porco, lingüiça...

Vejo, no olhar da mãe da menina – de tempos em tempos a detenho para uma informação qualquer – uma silhueta cinza que, definitivamente, não saiu do coração. Uma história, que ela julgava de amor, mas não era? Ou várias histórias?

No presente, após experimentar feiticeiros, deve descrer de príncipes. Como é complicado o relacionamento humano pela falta de transparência! Sob um véu de castelo, tantas vezes, encontra-se alguém que se alimenta do prazer-uso e passa as horas a fazer cálculos. Um coração puro salva todas as situações, vence as cordilheiras. Um coração dúbio, gerado por idéias errôneas a respeito de convivência, destrói-se e destrói, deixa-se engolir pelas crateras e se torna abismo..

A menina insiste em não ser cinza. Quando algo, por dentro, tenta corroê-la, encontra uma maneira de reagir. Gosta da história de Peter Pan e eu a vejo como fada Sininho. Espia e orgulha-se daquele que vive na Terra do Nunca, junto com os Meninos Perdidos, sereias, índios e piratas. Peter Pan, em duelo, vence o terrível Capitão Gancho. Um dia, Peter Pan poderá afastar os seus fantasmas. Entre Sininho, Peter Pan e a Terra do Nunca, continua à espera de uma pequena estrela, segundo ela, filha da Lua. Se vier, na noite com medos, repousará em suas mãos em concha.

Sininho carrega o pó mágico e, ao sacudi-lo, faz as pessoas voarem. A menina puxa o encanto, que alguns perdem por horas ou dias, com seu sorriso aberto, abraço macio e os olhos em festa ao encontrar os que a vêem como única.
Há alguns meses que a observo e me pergunto: “Como pode carregar o pó mágico, pó de pir-lim-pim-pim, se repousa em colo de aparência cinza?”

Semana passada, entendi. Ela chegou com ar de festa. A mãe lhe dera um vidro, com um dedinho de perfume, que encontrara em meio à sucata. Contou-me que, quando a mãe acha alguma coisa boa, traz, com autorização do patrão, como presente para um dos filhos. O perfume tem um certo tom dourado e o vidro brilha.

Atenta ao que está por fora, ao que a matéria enxerga, eu não percebera o esplendor e a magia que transbordam da sensibilidade da mãe da menina. Aparência cinza. Coração com Sol.

Sobre o Autor

Maria Cristina Castilho de Andrade: Cristina Castilho é professora de Português e agente das Pastorais da Mulher e a Carcerária. No trabalho com mulheres prostituídas e presidiários, circulou e circula pelo submundo, conhecendo sua realidade. Seu livro de crônicas conta a história das pessoas com quem se deparou no submundo do mundo. Escreve semanalmente no Jornal da Cidade de Jundiaí; mensalmente no Suplemento Estilo do Jornal de Jundiaí - Regional e, quinzenalmente, no Jornal de Abrantes - Portugal.

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