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Nenhum assassino é imortal

por Gabriel Perissé *
publicado em 18/05/2005.

A, digamos assim, crítica que o novo livro de Jô Soares recebeu no Jornal do Brasil do dia 1º de maio, foi, no mínimo, complacente. Marcelo Pen, da Folha de S. Paulo, também não critica o livro do autor, nem o autor do livro. Entrevista-o apenas. Na IstoÉ, Luiz Chagas não toca na ferida, apenas alisa o fardão que, por mais que negue querer vestir, com vesti-lo Jô Soares sonha.

Poderíamos descartar toda e qualquer crítica, de fato, alegando tratar-se de romance para entreter. Mais ainda por ser o autor humorista consagrado. Uma brincadeira com os imortais, cuja posição social dá trela à piada, como também é irresistível não brincar com o peso do próprio Jô.

A mortalidade dos imortais é prato cheio para uma fácil boutade cultural. O falecido jornalista e escritor Austregésilo de Athayde (presidente da ABL ao longo de 36 anos), só podia ter um apelido: Austregésilo de Ataúde. Jô menciona a frase jocosa de Olavo Bilac: “Sou imortal porque não tenho onde cair morto...”. E por aí vamos.

O poema criado no livro, paródia da Canção do exílio, diz o que muitos literatos pensam: “Não permita Deus que eu morra / Sem brilhar na Academia”. Este sonho, dentro e fora do livro, e dentro do livro homônimo pertencente à trama do livro, é o sonho que move o assassino, e o que leva Jô Soares a ter escolhido a ABL para lançar este seu novo título, a exemplo do que Paulo Coelho fez em 2000, lançando lá O Demônio e a Srta. Prym, dois anos antes de candidatar-se a uma vaga.

O problema fatal, a meu ver, em Os assassinatos na Academia Brasileira de Letras, é sentir em suas linhas o fruto de um trabalho minucioso, premeditado passo a passo, escrito calculadamente, realizado com a precisão de quem quis cometer um crime perfeito.

O crime está, por exemplo, em ostentar, como quem não quer nada, e no fundo tudo quer, um conhecimento detalhado, enciclopédico, do ambiente em que a história se passa. Referências, nomes, dados, datas... Tudo transpira pesquisa. Mais do que inspiração...

Pelo menos conta-se uma história! Mas uma história policial meio forçada, sem a originalidade, sequer, de autores considerados de segunda, como Agatha Christie ou Simenon.

Sobre o Autor

Gabriel Perissé: Gabriel Perissé é professor universitário, escritor e palestrante. Doutor em Filosofia da Educação pela USP, publicou em 2003 o livro Filosofia, Ética e Literatura - uma proposta pedagógica, em 2004, A Arte de Ensinar, e em 2005 o livro Elogio da Leitura, pela Editora Manole. Desde 1983, ministra palestras e cursos em escolas, faculdades, empresas, ongs, livrarias, bibliotecas e editoras, sobre temas relacionados à arte de ler, pensar, escrever e ensinar.

Site: www.perisse.com.br
Blog: www.oprofessordofuturo.blogger.com.br/

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