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O Pianista: Quadros da Irracionalidade

por Leonardo Vieira de Almeida *
publicado em 28/04/2003.

Em que pese o atual clima de barbárie da era Bush, o filme O Pianista, de Roman Polanski, poderia soar meramente oportunista, não dizer panfletário, ou clichê. Remoendo mais uma vez o tema da bestialidade nazista ao povo judeu, o diretor ainda sofreria o risco de se inserir na extensa lista de obras sobre o assunto, em que se deve apontar alguns filmes merecedores de crédito, como a Lista de Schlinder (desconsiderando-se o maniqueísmo próprio a Spielberg); A Escolha de Sofia, libelo sem consessões à dor.

Polanski vem construindo uma obra cinematográfica em que, partindo da premissa do individualismo, seja ele patológico (Repulsa ao Sexo, O Inquilino, O Bebê de Rosemary), ou como confronto do indivíduo com um contexto moral sufocante (Tess) , explora a inadequação do homem com um meio que se requer racionalista, ortodoxo, puritano. Inseridos em contextos absurdos os personagens de Polanski debatem-se entre o pathos de um idealismo marginal e o logos de uma cultura repressora. Sendo punidos com a loucura, a exclusão social ou a execução pública, não se torna incongruente compará-los aos personagens emblemáticos que fazem parte do panteão de artistas do início do século XX: Kafka, Beckett, Ionesco.

Wladyslaw Szpilman, o músico polonês que, como o próprio Polanski, percorreu os descaminhos da irracionalidade ariana (o diretor teve sua mãe morta num campo de concentração), é um Joseph K vivendo na realidade o que o escritor praguense, autêntico profeta, previu em seus livros. Numa descida dantesca ao inferno da intolerância humana, o que Szpilman vê são quadros de abominação: crianças agonizando nas ruas, cadáveres a céu aberto, execuções motivadas pelo prazer sádico. O gueto de Varsóvia é pintado com as tintas de Hieronimus Bosch e de Francis Bacon.

Porém, Polanski não aponta vítimas ou algozes. Está longe de uma visão simplificadora do holocausto. Tanto carrascos e súplices são produtos da repressão. Os estigmas que os judeus de Varsóvia passam a usar nas mangas de suas roupas (a estrela de Davi numa tarja branca) não são outros que os da Igreja em sua caça aos hereges, o do preconceito sexual. Ao recorrer a um bode expiatório para sua própria angústia (no caso, a falência econômica da Alemanha) o nazismo foi um agente macroscópico de uma problemática microscópica: a da irracionalidade levada ao radicalismo. Talvez, o artista que tenha dado um dos testemunhos mais contundentes desse processo foi o austríaco Herman Broch, industrial que aos 40 anos passou a se dedicar à literatura, e cujo livro, “Os Inocentes”, é uma crítica ferrenha ao irracionalismo, como desencadeador da derrocada alemã. Poeta da indagação (apesar dele se referir como nunca ter sido “poeta”) Broch foi um nitzcheano defensor da idéia de que ao criar uma cultura calcada na verdade, o Ocidente privou o homem do acesso ao sagrado. Essa repressão dos instintos, essa substituição de uma pluridimensionalidade por um perspectivismo cerceador, é a causa dos homens se fecharem em seu próprio individualismo, partindo de estruturas micro-familiares para a concepção de Volk (povo) que sob o emblema do partido social-democrata, se tornou o flagelo de Adolf Hitler. Num processo dialético, de um racionalismo fundamentalista explode-se na irracionalidade patológica do totalitarismo.

Cabe a Szpilman, assim como na obra que é uma discussão em aberto de toda a dúvida de Broch, A Morte de Virgílio, o papel da arte no mundo moderno, indagar da validade do artista em meio à insânia. Ao ser salvo pelo oficial nazista através da música, o pianista judeu parece dizer que a irracionalidade ainda pode servir de ponte para a conciliação humana. No caso, pela sublimação da loucura.

Sobre o Autor

Leonardo Vieira de Almeida: É escritor e arquiteto. Participou como co-autor do livro O disco de Newton, Imago, 1994, com poemas e contos e da Antologia n. 2 Poesia Viva, Editora Uapê, 1996. Possui trabalhos publicados em algumas revistas literárias como Nave da Palavra, Falaê, nos jornais Panorama e Balaio de Textos. "Os que estão aí" é seu primeiro livro de contos.

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