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Viagem ao Tibet
por João Possidônio Júnior
*
publicado em 20/04/2003.
Para entender melhor o Tibet, seu povo e significado dos lugares, é necessário um certo conhecimento da sua política e religião. Com monastérios e templos espalhados por toda parte, o Tibet se mostra com uma influência budista extremamente forte.
A religião no Tibet é a vida do seu povo, que por sua vez fazem deste lugar algo especial na Terra; com peregrinos de vários povoados fazendo suas orações e demonstrações de devoção nos templos, praças e ruas. O budismo foi introduzido no Tibet por volta do século VII e os seus dirigentes religiosos também tiveram por um longo período o controle político da região. Os monges mais experientes e sábios são denominados "lamas".
O Budismo tibetano, uma variante do budismo Indiano e Chinês, segue os ensinamentos de Buda e acreditam na reencarnação do Buda "Futuro" em uma pessoa humana; esta pessoa por sua vez é tomada como chefe religioso, chamado de Dalai Lama. O atual Dalai Lama, o décimo quarto, vive refugiado na Índia.
Além do Dalai Lama, há também o Banchan Lama (ou Banchan Erdeni), sendo também uma reencarnação do Buda "Futuro" e tomado como chefe religioso do lado oeste do Tibet; os dois lamas dividem (ou dividiam) pacificamente o controle religioso da região. Atualmente existem dois Banchan Lamas, um que foi escolhido e reconhecido pelo povo tibetano e que também vive refugiado na Índia e um outro escolhido pelo governo Chinês e que esta em Pequim.
A influência política Chinesa no Tibet remonta de longa data, e desde o século XIII a China considera o Tibet como uma região administrativa especial, porém efetivamente em 1951, sob o regime comunista, o Tibet se viu pressionado entre a sua forma política de governo e religião e a imposição do sistema de governo Chinês em suas terras. A China chama esta transição de "Liberação Pacífica do Tibet".
Na prática muito se vê em termos de desenvolvimento patrocinado pelo governo Chinês, no entanto, o povo Tibetano aceita este progresso mas ainda se mantém ligado aos seus princípios religiosos.
A viagem começa geralmente por Lhasa, a capital do Tibet e sua principal cidade. Situada a uma altitude de 3.700 metros acima do nível do mar, em conseqüência com menos Oxigênio no ar, é possível que o turista sinta os efeitos da altitude já nos primeiros dias; podendo aparecer alguma dor de cabeça, tontura ou cansaço sem motivo aparente. Isso pode ser resolvido com descanso, aspirina e evitando-se esforços; se precisar, pode-se comprar algumas garrafas de Oxigênio puro que são encontradas facilmente à venda nos hotéis.
Lhasa, a "cidade dos deuses" ou "cidade ensolarada", como é chamada pelos Tibetanos, é a típica expressão do Tibet, com muitos lugares de interesse turístico. As famosas rodas tibetanas estão em toda a parte com centenas de devotos orando e girando as rodas.
Dentre os vários templos budistas, o mais importante e mais procurado pelos peregrinos, devotos e turistas é Templo Jokhang que está localizado no distrito antigo de Lhasa. Este monastério foi construído no século VII e incorpora características Nepalesas e Indianas em sua arquitetura. Neste monastério acontecem as cerimônias de reencarnação (anúncio) dos Dalai Lamas e Banchan Erdenis e também os debates entre os lamas.
Ao redor deste templo caminha em procissão os devotos e peregrinos budistas, não há como ficar de fora, então o turista entra nesta roda-viva e passa a fazer parte desta corrente de energia mística. Há também uma pequena feira ao ar livre onde encontramos desde açougue até objetos religiosos e artesanato.
O maior monastério de Lhasa é o Drepung, situado a 10 Km da cidade, é um conglomerado de templos e um colégio para formação dos monges budistas. É muito fácil se perder caminhando pelas ruas estreitas e sinuosas deste monastério, no entanto existe um encanto mágico neste lugar onde se vê muitos monges estudando, devotos entoando canções tibetanas, penitentes orando em cima de telhados e um visual magnífico das montanhas.
Outro cartão postal de Lhasa é o Palácio Potala, antiga residência do Dalai Lama e ex-palácio do Governo. Hoje este palácio é tido apenas como relíquia cultural e atração turística, e é mantido pelos monges budistas. Localizado no centro de Lhasa, o imponente Palácio Potala foi construído no século VII durante o reinado de Songtsen Gampo, rei que unificou o Tibet e introduziu o Budismo como religião oficial, cobre uma área de 41 hectares. Este palácio de 13 andares consiste de pequenos palácios brancos e vermelhos, sendo os vermelhos para eventos oficiais mais importantes, tem 1000 aposentos, entre quartos, bibliotecas, "stupas" (monumentos que contém relíquias sagradas) e aposentos para os monges.
Na seqüência da viagem, chegamos em Gyantse, uma pequena cidade tipicamente tibetana, famosa pelo seu festival de corridas de cavalos que acontece em Abril. O caminho para se chegar em Gyantse também nos leva ao lago sagrado Yamdro Yumtso, cujo ponto mais alto, a Passagem de Kampa-la a 4794 metros, oferece uma vista esplêndida do lago. Encontramos também várias vilas pelo caminho, todas enfeitadas com bandeirolas com as cores do Budismo: amarelo, azul, branco e vermelho. Vemos também muitos rebanhos de ovelhas e yaks espalhados pelas montanhas geladas.
Em Gyantse, o mais famoso templo fica em Kumbum, no monastério Palcho, e é conhecido como templo dos 100.000 Budas, pois seu interior é todo decorado com inúmeras imagens e estátuas de Buda em suas mais diversas formas e representações. Este templo tem 32 metros de altura e 9 pavimentos. É imprescindível levar uma lanterna, pois não há luz no interior deste templo.
A cidade de Gyantse também é conhecida pelo seu caráter patriótico, pois no ano de 1904 ali aconteceu a batalha contra a brutal invasão Britânica no Tibet. A fortificação de Zhongshan é mantida como monumento histórico dessa batalha heróica, onde milhares de tibetanos foram mortos.
Na seqüência da viagem, prosseguimos para Shigatse, a segunda maior cidade do Tibet. Vale a pena salientar que não existem estradas terminadas entre as cidades mencionadas, a maior parte do trecho é feita por atalhos e desvios, os únicos veículos que trafegam neste caminho são aqueles equipados com tração 4x4, caminhões e tratores Há trechos em que simplesmente não há estrada e o motorista e/ou o guia tem que ter um bom conhecimento do local para que não nos percamos no caminho. Apesar disso, a paisagem é extremamente bonita e a viagem não deixa de ser emocionante, com o carro passando por ribanceiras um pouco assustadoras.
Shigatse é uma cidade de 500 anos de história, situada a uma altitude de 3.800 metros acima do nível do mar, e também onde fica a residência oficial do Banchan Lama.
Nesta cidade encontramos o maior monastério do interior do Tibet, o monastério Tashihunpo, com uma área de 300.000 m2 e foi construído no ano de 1447 por Gedun Truppa, discípulo de Tsongkhapa e primeiro Dalai Lama. O monastério incluí várias salas com muitas estátuas e "stupas" com relíquias dos antigos Bancham Lamas. Há também a estátua do Buda de Qiangba em bronze, que é a maior estátua de Buda "indoor" do mundo, com 26,5 metros de altura e é uma relíquia sob proteção do Estado.
Em Shigatse, vale a pena visitar a parte antiga da cidade e a feira popular para compra de artesanatos e artigos típicos do Tibet. Nesta região temos alguns bons restaurantes que servem comida tibetana, entre os pratos mais procurados está o filé de yak.
Deixamos Shigatse em direção a Tingri, a cidade mais próxima do monte Everest ou Qomolangma como é chamado em tibetano. Este percurso tem 250 Km e é um dos trechos mais difíceis de toda a viagem, devido a extensão e as condições ruins da estrada (quando existe estrada). O clima e a temperatura variam muito durante o dia devido a altitude, podendo passar de tempo ensolarado para chuvoso e depois com neve em questão de horas. No caminho passamos por diversas vilas de camponeses, rios formados pelo degelo dos picos nevados e contemplamos as montanhas até chegarmos em Lhatse, uma pequena vila tibetana. Daí então prosseguimos viagem até Tingri onde pernoitamos. Em todas estas cidades e vilas não se encontram restaurantes ou hotéis com características ocidentais, tudo é bem ao estilo Chinês, desde o café da manhã ao noticiário da TV.
Uma vez no Tibet, o telhado do mundo, é imperdível ir até o campo base do monte Everest e contemplar a montanha mais alta do mundo. O Monte Everest, 8.846 metros acima do nível do mar, é chamado pelos tibetanos de Qomolangma, que significa "Terceira Deusa". A melhor opção é acordar bem cedo e seguir em direção ao monastério Rongbuk, que fica a 200 Km de Tingri e onde existe um alberque que podemos passar a noite, no entanto só há vagas para, no máximo, 40 pessoas e não há telefone para reservar quarto em adiantado, por isso é bom ir cedo para garantir a vaga ao lado do monastério mais alto do mundo, construído no século XVI e situado a 4.980 metros acima do nível do mar, o qual proporciona uma visão extraordinária do Everest.
Do monastério Rongbuk até o campo base do Everest são aproximadamente 10 Km e uma boa opção para quem já se aclimatizou com o frio abaixo de zero graus Centígrados e a altitude de 5.140 metros, é fazer uma caminhada que dura cerca de 3 horas seguindo ao lado do rio que desce das geleiras da montanha. A visão do Everest do campo base é espetacular e emocionante; o lado norte da montanha mais alta do mundo é maravilhosa e o topo com uma grinalda de neve provocada pelos ventos cortantes cria um cenário inesquecível ao expectador.
Ter a oportunidade de ver a olhos nus o monte Everest é sem dúvida alguma um presente divino que nos enche de emoção e é privilégio de poucos. Existe um tanto de realização interior ao chegar no campo base, apesar de toda a dificuldade que é caminhar na neve, abaixo de zero, e naquele ar rarefeito.
Retornando ao monastério Rongbuk, ainda dá tempo de apreciar o pôr do sol atrás das montanhas geladas; o pico do Everest vai se tomando um tom alaranjado até se tornar uma silhueta escura na noite. A noite, por sinal, é repleta de estrelas que parecem estar bem próximas, dando a sensação de que podemos esticar a mão e tocá-las. O dormitório do monastério não tem quase conforto, porém é a melhor alternativa que há no lugar. A imagem do Everest permanece retida mesmo ao fechar os olhos para dormir.
Após visitar o campo base do Everest, o caminho é em direção a Zhangmu, que faz fronteira com o Nepal. Para tanto, deixamos o Parque Nacional do Monte Qomolangma e temos que cruzar a cordilheira do Himalaia, onde o visual da cadeia de montanhas que temos pelo caminho é muito bonito. Ao cruzarmos a passagem de Zhugula, a 5.420 metros, começamos a descer a cordilheira e a paisagem começa a mudar; o terreno árido e picos nevados vão ficando para trás e começam a aparecer pastos mais verdes e a vegetação vai se tornando mais densa, cachoeiras vão brotando na montanha e a neblina aparece entrecortando a mata.
Zhangmu é uma pequena cidade incrustada na montanha, com água abundante devido a suas muitas quedas d’água, e também funciona como entreposto comercial de artigos que são negociados entre a China e o Nepal. O congestionamento de caminhões com mercadorias é impressionante e o trânsito é difícil neste trecho.
Ao atravessarmos a fronteira com o Nepal, o Tibet fica definitivamente para trás; toma lugar os rostos, vestimentas e características nepalesas, que são muito parecidas com o estilo Indiano. Ficam na lembrança (e nas fotos) as imagens de um lugar indescritivelmente místico e maravilhoso. Os sons das canções e rezas tibetanas ainda ecoarão na memória por muito tempo, assim como as palavras sagradas “Om Mani Padme Humm”.
Informações adicionais:
http://www.tibet-tour.com
http://dalailama.com
http://homepages.ihug.co.nz/~greg.c/tibet.html
Sobre o Autor
João Possidônio Júnior: João Possidônio Júnior está na CHINA, vive em Xangai há mais de 03 anos e deve retornar ao Brasil em outubro deste ano de 2002 e promover uma exposição de suas fotos do TIBET. Possidônio nasceu em São José dos Campos, em meio a Revolução de 1964, cresceu no sub-distrito de Eugênio de Melo. Possidônio também é engenheiro mecânico, fotógrafo, artista plástico, pintor e poeta. E, seguindo uma vontade interior de expressar suas idéias e mensagens, vem ao longo de muitos anos produzindo trabalhos de pintura, desenho, escultura, poesia e fotografia. Este ano, ele lançou seu livro “Neblina - Poemas e Apontamentos”, em Xangai. Mesmo morando na China, é membro do Núcleo Fotográfico de Eugênio de Melo. Com inspiração e olhar atento para o cotidiano simples do ser humano e paisagens que o cercam, as fotos revelam ao observador algumas imagens captadas durante as viagens do artista pela Ásia.< ÚLTIMA PUBLICAÇÃO | TODAS | PRÓXIMA>
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