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Amizade de fachada

por Noga Lubicz Sklar *
publicado em 08/01/2009.

Se conseguir um novo amor, com toda a excitação que uma nova paixão estabelece - ultrapassada a quase impossível barreira física do sexo explícito, o contato tão temido com um corpo desconhecido e seus cheiros assustadores, frequentemente rejeitados -, já é complicado na nossa idade... imaginem então uma boa amizade. À primeira vista - ou, num mundo altamente conectado, à primeira e automática adicionada no site - pode até parecer que é bem tranquilo. Mas uma aproximação verdadeira, daquelas gostosas onde a gente se abre, se entrega, se encontra, discute qualquer assunto, sem medo nem risco de uma grande perda afetiva, aí, meus "queridos", é bem outra coisa.

Eu que o diga. Não sei bem por quê - já que na verdade acredito ser ótima amiga -, cultivar relações para mim jamais foi algo assim, que acontece na vida. Me abrir nunca nem foi problema, cresço na trama, transpareço, me exibo com gosto e não passo recibo, mas fazer-me entender é que é um drama. Antes que a questão se esclareça, é líquido e certo que eu perca a paciência, mas, como quase todo mundo - e cada vez mais neste mundo de aparência - careço de bons amigos (e, claro, de bons, preciosos "contatos"), então vamos lá. E se o aprimoramento exclusivo a dois com o marido estrangeiro, por um lado, alimenta a urgência de convívio, por outro limita a vasta experiência com a "verdadeira" vida que, como sempre, vocês já sabem: se desenrola lá fora. Ou dentro de uma tribo que sempre te deixa de fora.

O problema é antigo. Mamãe, coitada, fazia o que podia: me lembro da cena constrangida, ela me chamando para um encontro no clube e eu, bem calada, escondida no armário, tentando escapar ao aterrorizante perigo do(s) outro(s). Ui. Alívio temporário .

Pois é. Imaginem agora o prazer pressentido, aliado à falta total de compromisso, com a facilidade assim, meio robótica, para encontrar amigos em sites gratuitos de relacionamento, o incrível Facebook, por exemplo. Respondi positiva a um convite animador desses e logo depois, aceitando as sugestões de não sei que conselheiro social embutido, fui com uma sede de anos, áridos anos de um prático isolamento jamais vencido, ao pote enriquecido de nomes bem conhecidos, todos te aceitam de cara: ô delícia. Bem. Mais ou menos isso. Até que acontece, é claro, a primeira, a mais dolorida (por ser ainda meio desconhecida) e muito mal-sucedida exibição de uma intolerante, hum, intrigante falta de interesse por escutar o ponto de vista alheio.

Em toda uma vida de busca frustrada por irmãos de fé adquiridos, defenestrei sem dó, e sem dó fui defenestrada outras vezes, pelo mesmo e nada prosaico motivo: minha jamais negada origem mosaica, que embora eu nem sempre professe, esclarece, é claro, uma fidelidade ancestral implícita. Um traço cultural que eu aceito, aprecio, mas do jeito que posso e consigo, sempre abro ao debate, à pesquisa, à dúvida, à revisão constante do familiar compromisso. Fé cega, eu hein? Nunca foi comigo. Por isso não me espantei nem um pouco quando anos depois de ter quase perdido um grande amigo (este, como eu, de visceral ascendência semita, um brimo), na época do ataque ao Líbano, perco outro, nem tão íntimo, nem tão envolvido - uma recente aquisição interessante de Facebook, nada mais, e, nem por isso, sentido como tão dispensável quanto deveria -, por conta da guerra atual contra o Hamas, desprezíveis e retrógrados terroristas, o povo palestino que me desculpe.

Não defendo as posições de Israel como nenhuma fúria cega, nunca defendi, e nenhuma intolerância imposta por puro apego à famiglia, vamos combinar. Mas que alguém que nem tem o vínculo, nem o acesso à informação interna, nem a certidão de nascimento, nem a profundidade de uma perspectiva histórica de toda uma vida, nem a sensação insubstituível da íntima convivência local, nem o sangue, nem a herança genética, nem o envolvimento muito pessoal - por algumas vezes apaixonado mas, na maioria delas, nada disso -, com uma crise humana complexa, ancestral e sensível, alguém movido a contatos passageiros com comunidades fajutas, temporariamente aglutinadas, alimentadas por familiaridades forjadas e que têm como liga conveniências políticas de propaganda, tão mutáveis quanto descartáveis, amizade de fachada, isso sim, que não resiste ao mínimo argumento em contrário, nem se expõe a um sincero movimento de simples porém transparente aproximação, ufa, se sinta dono da única verdade, isso eu não admito: pelo tamanho da frase já deu pra entender que por mais que eu deseje, por mais que eu me meta, por mais que eu aceite me relacionar com uma controlada veracidade e eletrônica voracidade de Facebook, me perdoem a pressa, não fui feita pra isso.

Corre nas minhas veias caretas o sangue vermelho do sério compromisso. E se não for pra ser tudo, pra tudo e com tudo que vier ao comício, me omito. Me desligo. Deixo correr solto o rol breve de amigos com seu estudado, encomendado e muito contemporâneo não-mexa-comigo. Se quiser me seguir, me siga, mas não se envolva de maneira alguma com esta perigosa "amiga": a intimidade é um mal de crônica a que em lista pública eu não me submeto (e não, esta não sou eu: é apenas a regra aparente, o preço nunca pago, e raramente oferecido, para a conquista de verdadeiros amigos).

Conexão de ficcção (com um cê de você a mais, nem ligo)? Lamento. Não dá pra ser assim contigo.

Sobre o Autor

Noga Lubicz Sklar: Noga Lubicz Sklar é escritora. Graduou-se como arquiteta e foi designer de jóias, móveis e objetos; desde 2004 se dedica exclusivamente à literatura. Hierosgamos - Diário de uma Sedução, lançado na FLIP 2007 pela Giz Editorial, é seu segundo livro publicado e seu primeiro romance. Tem vários artigos publicados nas áreas de culinária e comportamento. Atualmente Noga se dedica à crônica do cotidiano escrevendo diariamente em seu blog.

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