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Causas impossíveis

por Noga Lubicz Sklar *
publicado em 30/10/2008.

"A arte é sempre e em todo lugar a confissão secreta, e ao mesmo tempo o movimento imortal de seu próprio tempo."
Karl Marx


1. Tudo bem. Eu entendo. Deve ser minha própria tendência particular à depressão, esse caro e intermitente transtorno elemental que entorta os meus temas e faz com que eu queira, digamos assim, que esta crise social não termine tão cedo, mas e daí? Só admito um passo à frente quando aquela luz secularizada, a tão capitalizável ação redentora que todos esperam, surgir num mais belo horizonte transformador, e isso, se São Jabor permitir. Pois foi recomendando na crônica de terça a cura para o crônico mal, entre tantos outros, do cinema de arte, ou melhor, do cinema e da arte, que este Santo Artista concedeu-me licença pra seguir criando: narrar vivências pessoais, as únicas intransferíveis. Ave, Seu Arnaldo.

2. E enquanto não rola, leio no Joaquim: "...agradou a Jam, que ria ainda da mesa montada - com prato, talheres e tudo o mais - no teto do banheiro masculino. Modernidade é isso aí." Será? Ai, gente. Vontade de sumir. Sou daquele tempo que o mesmo jornal celebra em artigo de primeira página, há de haver quem ainda se lembre, quando o nosso MAM, "um espaço de produção de arte", "era freqüentado por artistas, cineastas, poetas e críticos" e eu mais uma entre eles, pra quê mesmo é que vale um saudosismo inútil desses? Com essa onda diária de "nivelar por baixo", onde tudo que é bom e original e instigante esconde a envergonhada cara debaixo do tapetão vigente... ah. Melhor deixar pra lá. Sou eu que estou deprimida mesmo, e o resto do mundo não tem nada a ver com isso. Ou será que tem?

3. E Karl Marx nessa? Entra aonde nessa doida equação de moderno desconstrutivismo? Ou seria melhor: desconstrucivismo? Pois é. O que mais tem me espantado no desconstrutivo dia-a-dia do noticiário é o fato consumado de que para tantos a crise transita entre "quanto eu perdi na bolsa" e "não tenho dinheiro pra investir, não tô nem aí", mas gente: um valor mais alto se alevanta, e cobrem de Marx essa velha conta. Imaginem. Como não conseguiram assustar o bastante com a ameaça apavorante de um preto esperto na presidência, decidiram os ávidos centuriões em seu último gesto, impregnado de desespero, apelar pra ameaça de socialismo, a antítese diabólica dos pilares benéficos do capitalismo, eu, hein? Quem sou eu para comentar isso? É tudo palavrório vazio, confesse aí de uma vez: nem ler O Capital eu li, deve ser por isso que buscando no google algum aforismo do velho teórico idealista escolhi, dentre mais de 60, um que fala de... arte. Mas peraí que eu nem sou marxista e, cá entre nós, a bem da verdade nem sei bem o que isso significa.

4. Sim. Já sei. Devo ser mesmo ingênua, ou antiquada, ou louca, ou fatalmente ignorante, mas vendo o ataque radical das forças óbvias do mal (calma, gente: foi só uma rima eficiente, já que status quo, além de destoar do objetivo catequizante, ainda por cima atravessa o ritmo) contra aquilo que chamam de "redistribuição da riqueza", e o súbito e maduro desvio reativo do meu marido Alan para a extrema direita - taí uma coisa que ninguém me explica: pra onde sumiu aquele "filósofo naturalista", aquele poeta ardoroso, mímico inspirado e bardo itinerante dos anos 1960 que me conquistou na internet, pasmem, há menos de quatro anos? -, coisas que embora tentando bastante eu não entendo, e nem por todo amor do mundo tampouco aceito, não me conformo. Uma pena.

5. Procurando sentido onde todo sentido me falta vou quase às lágrimas de fato ao compreender que é por ter sido criada, educada e treinada tendo o socialismo como o que há de melhor para o mundo - o sonho frustrado de justiça e beleza que papai adotou quando era jovem e vivo, à sombra fanada do velho kibutz onde eu nasci e que o próprio estado moderno de corrupção ativa se encarregou de eliminar - sim, é por isso que me deprimo. Dá pra entender o porquê de eu estar tão triste hoje. Triste e vazia e derrotista, pregando algo que eu mesma nem vivi, mas e daí? Nada impede que eu sonhe na calada da mídia com um mundo melhor, e pior: aproveite, por meros sete últimos dias, a esperança explícita de que as coisas realmente mudem antes que o mundo se exploda. Sonhar é possível, e eu não permito nem por um minuto que alguém me negue pelo menos isso.

6. Além do mais, ou sou estúpida, ou iludida, ou retardada, sei lá, perdida em síndrome de adolescência tardia que essa coisa de idealismo profundo não se encaixa nas mentes mais maduras, mas não ficou claro pra todo mundo que o Deus do Capitalismo tem muitos pecados? Pecados demais pra ajoelhar-se no milho em frente ao global confessionário? Hum. Não sei. O que sei é que se o muro caiu, e a Rua do Muro já quase ruiu, deve haver no futuro algo novo que eu desconheço e que, embora ignorado por muitos - quase todos -, já tenha decretada a data de seu começo: eis aí, em pleno processo de forte tropeço, a trôpega marcha da história. É bem mais embaixo o buraco, viu, gente? E é somente caindo sem rede que arriscaremos ver nascer em breve, deste caos espiralado da crise, um neosociobelutopicocapitalvoluntarismo, a bênção, meu São Judas Tadeu.

7. Eu sei. Não precisa dizer. "É tudo um velho clichê, mas pra mim não soa como um", e olhem que a frase nem minha é, tirei do livro do inglês Julian Barnes sobre a morte, "Nothing to be frightened of", que estou lendo agora. E gostando muito, taí por ora o lado bom da vida, pura ironia.

Sobre o Autor

Noga Lubicz Sklar: Noga Lubicz Sklar é escritora. Graduou-se como arquiteta e foi designer de jóias, móveis e objetos; desde 2004 se dedica exclusivamente à literatura. Hierosgamos - Diário de uma Sedução, lançado na FLIP 2007 pela Giz Editorial, é seu segundo livro publicado e seu primeiro romance. Tem vários artigos publicados nas áreas de culinária e comportamento. Atualmente Noga se dedica à crônica do cotidiano escrevendo diariamente em seu blog.

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