Crônicas,contos e outros textos

PÁGINA PRINCIPAL LISTA DE TEXTOS Noga Lubicz Sklar


COMPARTILHAR FAVORITOS ver profile do autor fazer comentário Recomende para um amigo Assinar RSS salvar item em delicious relacionar no technorati participe de nossa comunidade no orkut galeria relacionar link VerdesTrigos no YouTube fazer uma busca no VerdesTrigos Imprimir

São Miguel das Missões Verdes Trigos em São Miguel das Missões/RS - Uma viagem cultural

VerdesTrigos está hospedado no Rede2

Leia mais

 




 

Link para VerdesTrigos

Se acha este sítio útil, linka-o no seu blog ou site.

Anuncie no VerdesTrigos

Anuncie seu livro, sua editora, sua arte ou seu blog no VerdesTrigos. Saiba como aqui

Vergonha de quê?

por Noga Lubicz Sklar *
publicado em 12/02/2008.

"Jim, how beautiful you are!"
de Nora Barnacle a James Joyce, morto, pelo visor do esquife


Que por trás de um grande homem existe sempre uma grande mulher, todo mundo sabe. Mas por trás de uma grande mulher, existe o quê? Um homem pequeno? Um ego masculino domado? Amansado, sim, mas a pão-de-ló, cama, cozinha e roupa lavada, café da manhã na cama. Pequeno? Talvez. Mas, certamente, raro. Nem sempre paciente.

"Bem, Jim está escrevendo seu livro. Vou pra cama e este homem se senta no quarto ao lado e continua rindo do que ele mesmo escreve. Então eu bato na porta e digo, Jim, olha, pára de escrever ou então pára de rir." É meia-noite, num certo apê em Zurique. Mas pelo que sei, poderia ser aqui, ao meio-dia, nesta sala apertada do Alto Leblon, e esta fala na boca do Alan, é, gente. Sim: é duro ser Noga e Nora ao mesmo tempo.

Mas quando leio Ulisses, me esqueço de tudo. Meu riso deliciado evoca o eterno riso deliciado daquele homem de outrora por trás do texto: um eco póstumo; e-terno. No que se refere à escrita, me identifico com J.J. em quase tudo. Escrevo tão bem quanto ele, mas se ele nunca tivesse escrito, eu mesma jamais escreveria. Sou arrogante como ele, detestada, ousada e iludida quanto à própria importância como ele era, bem: neste último aí digamos que eu esteja sozinha agora, porque Joyce, todo mundo sabe, transcendeu faz tempo a própria miséria em que acreditou a vida inteira ter vivido. Me entrego. Me arrebento. Escrevo cartas e artigos (meio desesperada, às vezes: desesperançada) explicando o que escrevo. Imponho ao leitor e aos críticos a jactância da minha literatura, e se recebo de volta não mais que um ostracismo descrente, não me calo em tréplica. Jamais me calo, esta é que é a verdade. Só quando canso de mim. Todo escritor faz isso, não é? E se não faz, de duas uma: ou porque não pode, ou porque não se arrisca. E se não pode e nem se arrisca não se reconhece escritor. É isso.

Em tudo o mais, reconheço, difiro dele. Não bebo demais. Não traio. Não sacrifico a família ao meu autocentrado delírio, bem. Isso quem sabe é por não ter família. J.J. teve patronos, ou melhor, patronas: três mulheres que, por trás da insistência dele, preservaram para o futuro a impetuosidade tão (im)própria da boa literatura. Uma delas, dizem, custou a Joyce dez anos da vida dela e quase um milhão de dólares, ops, não seria o contrário? Quem doou o quê, e a quem? Bem. Hoje em dia, vocês sabem, ninguém doa nada, doa a quem doer. Ô miséria.

Aos meus herdeiros, não deixo nenhum legado em dinheiro, nem em propriedades, nem mesmo num mero gesto de boa-vontade com o mundo. Não. Deixo apenas a minha jamais plenamente reconhecida genialidade: livros publicados, outros inéditos, todos não-lidos, poucos compreendidos, escritos esparsos acumulados. E está de bom tamanho, me acreditem.

E quanto a este texto? Acharam difícil de encarar? Acreditar que alguém pudesse ter a si próprio em tão alta conta? Pois é. Aprendi com Joyce, faz pouco tempo. E a ninguém interessa se esta onda indomável de sou-mais-eu reflete, simplesmente, um interior em conflito - uma incurável e contagiosa mania de ser humilde -, que nega teimoso tudo isso. Vale mesmo o que está escrito. Vou ter vergonha de quê? De quem? Pra quê?

Sobre o Autor

Noga Lubicz Sklar: Noga Lubicz Sklar é escritora. Graduou-se como arquiteta e foi designer de jóias, móveis e objetos; desde 2004 se dedica exclusivamente à literatura. Hierosgamos - Diário de uma Sedução, lançado na FLIP 2007 pela Giz Editorial, é seu segundo livro publicado e seu primeiro romance. Tem vários artigos publicados nas áreas de culinária e comportamento. Atualmente Noga se dedica à crônica do cotidiano escrevendo diariamente em seu blog.

Para falar com Noga senda-lhe um e-mail ou add-lha no orkut.

< ÚLTIMA PUBLICAÇÃO | TODAS | PRÓXIMA>

LEIA MAIS


Sobrevivendo com a chuvinha, por Efraim Rodrigues.

Estamira, por Paulo da Mata-Machado Júnior.

Últimos post´s no Blog Verdes Trigos


Busca no VerdesTrigos