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Nascido no Inferno
por Abrão Slavutsky
*
publicado em 04/05/2007.

Esse é um trecho do livro "É Isto um Homem?" - e o título tinha que ser uma pergunta, pois toda sua obra questiona quem é mesmo o homem, capaz de tanto mal e também de bons sentimentos. Gostamos de nos definir como homo sapiens, mas somos também homo demens. Nos agrada a imagem de sapiens, daquele que sabe, do mais evoluído da espécie. Já ser homo demens, louco, é chocante, e evitamos essa verdade que nos angustia. Como pôde nascer um escritor no maior dos infernos do século XX é um mistério. Sua obra pode ser lida como uma resposta a Theodor Adorno, que afirmou não ser possível escrever poesia depois de Auschwitz.

Primo Levi tem seu nome inscrito entre
os escritores indispensáveis do século XX
Antes disso, já havia recebido uma lição de Steinlauf, que lhe disse: o campo é uma grande engrenagem para nos transformar em animais. Somos escravos, expostos a qualquer injúria, destinados a uma morte quase certa, mas ainda nos resta uma opção. A opção de recusar nosso consentimento, e, para isso, devemos nos lavar mesmo que seja com água suja e nos secarmos em nossas roupas. Devemos marchar eretos e lutar para continuar vivos e poder relatar a verdade e dar nosso depoimento. Também faz referência a um pedreiro italiano que o ajudou muito, bem como a importância de sua condição de químico. Jorge Semprun definiu este livro como "obra-prima de comedimento, de fabulosa nudez no testemunho, de lucidez e compaixão".
Philip Roth, em uma longa conversa com Primo Levi, diz a ele que seu pensamento prático, científico e humano foram condições indispensáveis para sua sobrevivência: "Por seres um homem de precisão, que controla as experiências, e busca o princípio da ordem, o cientista e o sobrevivente são uma só coisa". Diante dessa análise, Levi exclama: "Muito bem, você acertou em cheio". A Trégua é a continuação histórica de É isso um Homem?, escrito 14 anos após; seu tema é a viagem de volta de Auschwitz a Turim, onde morava. Inicialmente, Levi ficou de fins de janeiro de 1945 até setembro em um campo na Cracóvia, nas confusões que se vivia no pós-guerra. A viagem de trem só começou em setembro e durou 35 dias, fazendo voltas desnecessárias. Num estilo refinado, com frases bem tratadas, descreve sua volta à vida, depois de viver do lado da morte. Consegue divertir o leitor ao narrar episódios exóticos, alegres, estranhos. Dois amigos se destacam no livro; o primeiro é um grego que, ao conhecê-lo, o chama de estúpido, porque está sem sapatos. O grego tem uma sabedoria prática, conhece garotas e talharins, Juventus e música lírica, guerra e blenorragia, vinho e mercado negro. O trabalho é o fundamento de sua ética, que envolve algumas atividades lícitas, mas também o contrabando, o furto, a trapaça. Em tempos de guerra, alega que é preciso ter sapatos e comida. Costuma dizer: "A guerra é sempre, o homem é o lobo do homem".
O outro amigo, César, mantém grande calor humano em todas as horas de sua vida. Para ele, o trabalho é, de vez em quando, uma desagradável necessidade, nunca uma obsessão, como acontece com o grego. O grego é avaro, racional, lobo solitário em eterna guerra. César é livre, pródigo, um filho do sol, amigo de todos, não conhece o ódio nem o desprezo. Levi escreve: "Conviver com César me reconciliou com o mundo, e reacendeu em mim a alegria de viver, que Auschwitz apagara". São muitas as histórias contidas na "Trégua", algumas divertidas, contrastando com a dor de tudo que ele havia sofrido. A partir de 1975, Levi dedicou-se só a escrever, aposentado como químico. Pôde assim investir ainda mais no seu caminho de escritor e conferencista. Viajou o mundo, deu um sem número de entrevistas, algumas transformadas em livros, e ganhou vários prêmios literários.

Fonte: Zero Hora
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