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Leituras em 2006: um esboço de retrospecto
por Chico Lopes
*
publicado em 06/01/2007.
"Lugar algum em parte alguma", de Nelson de Oliveira (Record), me agradou bastante, pelo nonsense fino e os calculados e bem sucedidos delírios da prosa de Nelson. "Modo de apanhar pássaros à mão", revelou, para mim, a Maria Valéria Rezende contista, com alguns contos particularmente bem escritos e sedutores. "Contos negreiros", de Marcelino Freire (Record), me pareceu um livro de uma força inegável - fui arrastado pelo clima das narrativas-cantos de Marcelino, cujo talento só parece estar crescendo, nos últimos anos. Também me surpreendi com a descoberta dos contos agudos e atmosféricos de "A leste da morte", livro de Nilto Maciel editado pela pequena Bestiário, acessível a uns poucos, mas merecedor da maior atenção. Outra boa surpresa foi reencontrar pela Internet uma velha amiga, Yara Camillo, que conheci como contista em esboço nos anos 80 e cujo talento se confirmou em "Hiatos" (RG), livro em que alguns contos são verdadeiros primores de humor e sensibilidade. E foi, para mim, a grande descoberta do ano, em termos de contos, o contato com o livro "Faca" (Cosac & Naify), de Ronaldo Correia de Britto, escritor pernambucano que me parece injustamente pouco lido por aqui. A qualidade de sua prosa enxuta, substantiva, em que nenhuma palavra parece fora do lugar, é incomum e sugere um mestre oculto.
Em termos de romance, não li os que parecem estar sendo mais votados e citados, até porque, como disse, as unanimidades não me arrastam, e, tanto quanto possível, leio pelo prazer da leitura, sem que a moda e as vitrines de livrarias, onde reluzem os nomes de maior venda, me aliciem. Mas, recebi o último de Ignácio de Loyola Brandão, "A altura e a largura do nada" (Jabuticaba), e gostei de ver ampliado o universo que o escritor já explorara no belo romance "Dentes ao sol", do início de sua carreira - o de sua Araraquara natal. É particularmente forte o senso de absurdo, o humor negro, as referências nostálgicas, brincalhonas, poéticas, que nos assediam, na pintura de uma cidade do interior cheia de personagens cativantes. Outro prazer constante que os livros de Loyola oferecem é essa capacidade de cunhar títulos delirantes que o escritor tem. "A altura e a largura do nada", que o leitor naturalmente saberá o que é ao ir mergulhando naquele mundo araraquarense-universal, é um achado.
Releio mais do que leio, esta é a verdade. E, pela boa razão de que os livros novos são caros demais nas livrarias, vivo fuçando em sebos, onde reencontro livros que um dia tive e amei como "A canção da relva", obra-prima de Doris Lessing, e "O chamado da selva", de Jack London. Não se coloca esse tipo de leitura em retrospectos solicitados aqui e ali já que não representam o que está em voga, o que saiu pelas grandes editoras nacionais do momento, mas, na verdade, o mundo da releitura é um grande consolo, quando se olha ao redor e não se vê nada muito estimulante. Acho até que as pessoas que têm contato com o mundo dos livros deveriam voltar-se mais para as próprias estantes, constatar em algumas lombadas títulos que nem leram direito, que apenas colocaram lá, e empreenderem a leitura, podendo fazer grandes descobertas.
Acontece muito, a quem tem contato constante com esse universo editorial, que receba livros de autores novos e não haja tempo ou disposição para lê-los. Algumas edições desanimam, pela aparência deficiente, ou dão aquela impressão de aridez, de coisa forçada, de um universo novo em que não queremos penetrar. Vai ficando difícil, à medida que se envelhece, ter boa vontade para com gente nova, e isso não deve surpreender a ninguém. A idade "provecta", por assim dizer, é a idade do amadurecimento espiritual, da confirmação do que se conhece e se ama, e, por uma questão de tempo, parece muitíssimo mais fecundo ficar em terrenos já percorridos e descobrir encantos novos nesses mesmos terrenos. Nesse caso, o que se chama de "monotonia" nada mais que é a confirmação de uma personalidade, que nos foi árduo conquistar e de que, compreensivelmente, não abriremos mão. Quais dos livros atuais, afinal de contas, podem competir com "Em busca do tempo perdido", "Dom Casmurro", "A morte de Ivan Illich" ou "Grande sertão: Veredas", só para citar alguns?
Na verdade, a chatice dos retrospectos é o peso que a temporalidade, a circunstância, exerce sobre eles. A gente, lembrando Drummond, que ser eterno, não moderno, e, por força de estar ao lado de livros, escrevendo-os, traduzindo-os, mergulhando em alguns e remergulhando em outros, mal se dá conta dessa coisa de calendário.
Algo que foi escrito lá em algumas noites atormentadas de fins do século 19 ou do início dos 20 - digamos, um "Inferno", de Strindberg - nos diz mais que qualquer coisa cunhada na atualidade, no novíssimo milênio tecnológico e presunçoso.
E nos situa fora e acima do tempo. Com esse poder maravilhoso e redentor que a literatura tem de nos dar mundos próprios, autônomos, onde a Imaginação é a única rainha.
Sobre o Autor
Chico Lopes: Chico Lopes é autor de dois livros de contos, "Nó de sombras" (2000) e "Dobras da noite" (2004) publicados pelo IMS/SP. Participou de antologias como "Cenas da favela" (Geração Editorial/Ediouro, 2007) e teve contos publicados em revistas como a "Cult" e "Pesquisa". Também é tradutor de sucessos como "Maligna" (Gregory Maguire) e "Morto até o anoitecer" (Charlaine Harris) e possui vários livros inéditos de contos, novelas, poesia e ensaios.Mais Chico Lopes, clique aqui
Francisco Carlos Lopes
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