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O texto como catarse

por Moacyr Scliar *
publicado em 16/07/2006.

Pessoas inteiramente felizes não escrevem. Escrever é algo que resulta de algum grau de mal-estar

A palavra mais usada na literatura atual é muito curta: "eu". O número de textos escritos na primeira pessoa é cada vez maior e configura uma verdadeira tendência, que já tinha sido antecipada pelo jornalista e escritor Tom Wolfe, quando se referiu aos anos 70 como a "Me Decade", a década do eu. Na verdade, é a culminação de um longo processo inaugurado pela modernidade que, ao consagrar a noção do indivíduo, possibilitou esse tipo de literatura, praticamente desconhecida no passado. As numerosas narrativas da Bíblia, para ficar só num exemplo clássico, foram elaboradas por autores anônimos que jamais ousariam deixar sua marca pessoal no texto sagrado.

É preciso dizer que esse fenômeno não significa necessariamente egoísmo ou vaidade, pode ser uma reação ao passado que negava individualidades e padronizava os modos de ser. A "Me Decade" e a literatura do eu representam, assim, uma forma de afirmação pessoal que hoje faz parte do equipamento de sobrevivência dos seres humanos.

A primeira pessoa aparece na literatura de diferentes formas. Quando se trata de ficção, é um personagem imaginário, um disfarce não raro tênue para o próprio narrador. Ou então é uma autobiografia. Ou é um depoimento pessoal: alguém falando sobre uma doença que teve, sobre um problema que viveu. A forma de publicação varia. Pode ser um livro. Pode ser um artigo ou uma carta, em jornal. Pode ser um blog.

Vamos pegar o caso da literatura, que é clássico. Quase todos os escritores começam sendo autobiográficos. Com o correr do tempo, adquirem o domínio da forma e a maturidade que permitem criar personagens com vida própria. Mas por que as pessoas escrevem? As respostas variarão. Alguns dirão que vêem na palavra um instrumento de criação estética. Outros, contudo, dirão que sentem necessidade de colocar para fora aquilo que lhes atormenta. Ou seja, uma catarse. A palavra vem do grego e significa purga ou purificação (é claro que os utilizadores da catarse preferirão esta segunda opção).

Pessoas inteiramente felizes não escrevem. Escrever é algo que resulta de algum grau de mal-estar psicológico, de algum grau de neurose. Problemas emocionais não são raros entre os escritores e, em Touched With Fire, a psiquiatra norte-americana Kay R.Jamison colecionou algumas dezenas de casos. Talvez seja uma condição necessária, mas não é uma condição suficiente. Todo Kafka é um neurótico, mas nem todo neurótico é um Kafka, já disse alguém. Freqüentemente sou procurado por pessoas que me dizem: minha vida daria um romance, só que eu não sei escrever este romance.

Pois é. A diferença entre catarse e literatura é esta: literatura é obra de quem tem intimidade com as palavras, de gente que sabe usá-las de forma original e criativa. Mas isto não deve obscurecer o fato de que escrever é bom para todo mundo. Livro, blog, diário íntimo, e-mails, cartas, não importa: escrevam. Escrever é uma forma de auto-interrogação, No mínimo ajuda a pessoa a descobrir quem ela é.

(Zero Hora, Porto Alegre, 25 jun. 2006.)

Sobre o Autor

Moacyr Scliar: Nasceu em Porto Alegre, em 1937. É formado em medicina, profissão que exerce até hoje. Autor de uma vasta obra que abrange conto, romance, literatura juvenil, crônica e ensaio, recebeu numerosos prêmios, como o Jabuti (1988 e 1993), o APCA (1989) e o Casa de las Americas (1989). Já teve textos traduzidos para doze idiomas. Várias de suas obras foram adaptadas para o cinema, a televisão e o teatro.

O centauro no jardim, A majestade do Xingu, A mulher que escreveu a Bíblia e Contos reunidos são alguns dos livros marcantes de sua vasta obra literária, que soma hoje mais de 70 títulos publicados. Entre os recentes, destacam-se o romance Na noite do ventre, o diamante e o juvenil Um menino chamado Moisés, uma reconstituição imaginária da infância do famoso personagem bíblico.

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