Nasci numa segunda-feira, alguns dias após a morte de Albert Camus, o existencialista argelino. Eu sequer tinha nome para o batismo. Ainda nascituro, tia Porcina persuadiu por meses para que eu fosse nomeado Anselmo, estava absolutamente certa deste nome para mim. Já havia convencido boa parte da família de que Juscelino ou Brasilino, embora fossem nomes da moda, não seria bom nome para um filho dos Terras.
Para ela e boa parte da família, Anselmo era mais nome, tinha toda uma carga cultural importante, mas enfrentou o veto fatal de minha mãe. Coube a meu pai colocar fim à celeuma, sem qualquer justificativa: "Levará o nome do frei Henrique de Coimbra!" Emudeceram todos. Mamãe assentiu, afinal [confessou-me alguns anos antes de sua morte] tivera um candidato a namorado com este nome. Assim, eu, filho de José Terra, fui batizado Henrique Chagas.
Se com o nome sela-se um destino, levei a sério o traçado por meu pai. Em plena adolescência, com apenas quatorze anos, saí de casa, deixei meus pais e meus irmãos, ingressei num seminário católico; não tinha a intenção de ser padre, rezar missa ou aconselhar quem quer que seja [meu pai sabia disto], queria ser um palestrante, um mensageiro, um profeta, um disseminador de boas novas. Assim, tornei-me, como que predestinado pelo nome, religioso, apenas frei, irmão, cujos votos renunciei aos vinte e dois anos, idade certa para dar novo rumo à vida. Quedou-se o frei, todavia restou em mim o gosto pela difusão de boas novas, de cultura, de arte e literatura, e, enfim, das coisas do espírito.
Não, eu não acredito que o nome predetermina os rumos que vida dá. Sou eu quem dá os rumos à minha própria vida. Mesmo que eu me chamasse Juscelino, Brasilino, Alberto ou Anselmo, talvez até tivesse que pagar algumas promessas [essa foi sutil], mas chegaria aonde cheguei. Bobagem, tudo besteira, eu gosto do meu nome. O que importa mesmo, digo-lhe, é que pertenço à tribo dos Terras.
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