Data: 14 de março, a partir das 19h
BAR CANTO MADALENA
Rua Medeiros de Albuquerque, 471
Vila Madalena - São Paulo
tel.(11) 3813-6814
Uma claridade ofuscante invade e dilata e faz cada vez mais longo o dia do homem contemporâneo. Esta luz, que explicita aquilo sobre o que se derrama, reduz tudo a uma forma plana e inequívoca. Quando não há mistério, as coisas oferecem-se como objeto, não despertam cerimônia nem reverência, mas convidam à manipulação e ao consumo;
A Mulher no Escuro, obra que reúne quatro peças teatrais e quatro contos de
Cláudia Vasconcellos, desafia esta tendência luminar, denuncia seu perigo, e propõe, no refúgio da noite, o cultivo de sombras e dúvidas.
Na peça “
Lágrima de Vidro”, homem e mulher dialogam no meio da noite: “então, não deu certo”, diz ela; “você nunca dorme?”, indaga ele. No intervalo dessa cadência, duas formas de relacionar-se com a Arte, pelo assombro ou esclarecimento. No monólogo “
Sete Dias do Rei”, um monarca desveste a incômoda roupagem da certeza e, ao revelar-se sujeito na dúvida, desconcerta os supostos bobos da corte que o cercam. Em
“A Mulher no Escuro”, peça que dá nome ao livro, memória (m1), consciência (m2) e juízo (m3) deflagram a solidão da existência no instante da morte de uma pianista (solidão que também se vê no conto “Quando a noite”). Em “Tryst”, dois personagens – primeiro reclamante e ouvinte – nos levam ao futuro sistematizado, instrumentalizado. Tornados autômatos, o que resta do “especificamente humano”?
Quanto aos contos, “
Narrator” traz à tona a liberdade associada ao ato de criação – tema de certo modo presente em “Filete Ínfimo d’Água para um Rio”, que busca capturar “um estado de ânimo literário” rumo a uma obra futura. Em “Quando meu irmão ficou cego”, de teor fantástico, um menino que não enxerga detém o saber em sua escuridão-oráculo. Sua irmã nos leva a assistir à queda de uma sociedade arcaica diante do “cerco luminoso da modernidade” – a partir do qual, diz ela, “a cegueira obstinada de meu irmão começou a incomodar, e a escuridão de seus olhos foi mesmo considerada uma afronta”.
CLÁUDIA VASCONCELLOS é dramaturga, mestre em Filosofia pela USP e doutoranda em Teoria Literária na mesma instituição, onde realiza pesquisa sobre a obra dramática de
Samuel Beckett.