Era uma vez um velho estranho. Ele vivia numa caverna na qual se refugiara fugindo ao ruído das aldeias. Tinha a fama de mago e por isso possuía alunos que esperavam aprender com ele a arte da magia. Ele, porém, não cogitava disso. Só procurava saber o que não sabia, mas tinha a certeza do que sempre ocorria. Tendo meditado muito tempo sobre o que nossa meditação não alcança, não teve outra saída para sua situação precária a não ser pegar uma argila vermelha e fazer todo tipo de desenhos nas paredes de sua caverna, a fim de descobrir como aquilo que ele não sabia poderia ser. Depois de muitas tentativas chegou ao círculo. "Isto está certo", achou ele, "e mais um quadrilátero dentro" e assim ficou melhor. Os alunos estavam curiosos, mas sabiam apenas que algo acontecia com o velho; eles teriam gostado demais de descobrir o que realmente ele fazia. Perguntaram-lhe: "O que fazes lá dentro?" Mas o velho não dava nenhuma informação. Descobriram então os desenhos na parede e disseram: "Ah! é isso!", e copiaram os desenhos. Mas assim, sem perceber, inverteram todo o processo: anteciparam o resultado, esperando com isso forçar o processo que havia conduzido àquele resultado. Assim acontecia outrora e ainda acontece hoje.
Já mencionei antes que além dos processos de transformação técnicos há transformações naturais. Todas as idéias acerca do renascimento fundamentam-se neste fato. A própria natureza exige morte e renascimento. O velho alquimista DEMOCRITO diz: "A natureza alegra-se com a natureza, a natureza abraça a natureza, e a natureza vence a natureza"
[1]. Há processos naturais de transformação que nos ocorrem, quer queiramos ou não, saibamos ou não. Tais processos produzem consideráveis efeitos psíquicos, que bastariam para que se indagasse reflexivamente o que realmente se produziu. Como o velho da nossa história, ele desenhará mandalas, entrará em seu círculo protetor e na perplexidade e angústia da prisão por ele mesmo escolhida à guisa de refugio, se transformará em um ser semelhante aos deuses. As mandalas são lugares de nascimento, ou melhor, conchas de nascimento, flores de lótus das quais nasce o Buda. O iogue sentado em flor de lótus vê-se transformado em uma figura imortal.
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[1] [BERTHELOT, Collection des anciens alchimistes grecs, 11,1, 3, p, 43 (45).]FONTE: JUNG, Carl Gustav. "Os Arquétipos e o Inconsciente Coletivo". Tradução de Dora Mariana R. Ferreira da Silva. Petrópolis: Vozes, 2000, capítulo V, volume IX/1 das Obras Completas, parágrafo 233.