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RESENHAS

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Uma Estréia Promissora

Ronaldo Cagiano*

Uma estréia literária nunca deve ser de afogadilho, sob pena de o autor ser estigmatizado por uma obra desnivelada. Raros escritores não se condicionam aos arruídos editoriais e não se deixam seduzir pela necessidade precoce de romper o anonimato. Dentre os que resistiram ao bafejo da mídia e se concentraram na depuração de seu ofício está o poeta mineiro José Aloise Bahia. Após consciente amadurecimento e cuidado no seu artesanato poético, só agora, aos 43 anos, oferece ao leitor um trabalho consistente e de qualidade, com os poemas que enfeixam o livro Pavios Curtos (Ed. Anome Livros, Belo Horizonte, 2004, 100 páginas, R$ 20,00), também uma obra de arte quanto ao projeto gráfico.

A poesia aloiseana burila a linguagem com precisão de estilista e pugna por uma contenção estrutural sem abandonar a densidade. Faz escalas na tradição e na vanguarda, realizando uma espécie de ponte entre o passado e a modernidade. Vamos encontrar desde os versos alexandrinos (Soneto), passando pelo verso livre com poemas mais discursivos (Raio de Sol para Fernando Pessoa), microtextos em prosa (O Rumor das Imagens) até exercícios com hai-kais e alguns influxos concretistas (Temperança) - uma poética híbrida, que tanto contempla a ruptura formal quanto preza o cânone.

Sua obra enceta um diálogo com diversas gerações e movimentos estéticos. Perceptíveis as influências de Mallarmé, Leminski, Gullar, Borges, Bandeira, Apollinaire, Fellini, Chagall, Drummond, revelando uma interface do seu trabalho com as artes plásticas e o cinema. Essa versátil manufatura de confecções poéticas é fruto de sua intimidade com a palavra, pois sendo jornalista, crítico literário e colaborador de diversos jornais, demonstra que bebeu nas melhores fontes e recolhe desse espólio conceitual e formal matéria para uma dicção muito particular.

Pavios Curtos distingue-se como um livro de "insights poéticos, concretos, imagens e variantes" e com esse leque de recursos Aloise deu espaço a diversas vozes e com elas construiu um lúdico memorial da sua experiência teórica e humana. Em sua leitura filosófica e social também abre espaço para um lirismo transcendente, que, embora evoque os territórios afetivos, se contrapõe ao sentimentalismo exacerbado. Nesses poemas delineia-se a íntima relação do autor não só com o universo literário, mas com o mundo das imagens, o que lhe possibilita uma alternância entre o visual e o verbal, o que corresponde à sua inquietação criativa, com a qual é capaz de (re)colher do caos quotidiano toda sua carga de tensão e numa crítica escatológica, comunica metaforicamente a crise da modernidade e reflete sobre seu cipoal de contradições.

Aloise é um poeta sintonizado com as emergências de seu tempo e a responsabilidade do processo criativo. Sem deixar-se contaminar pela angústia da lógica editorial cada vez mais hegemônica e monopolista, começa a traçar um silencioso e seguro caminho. Não terá dificuldades em impor-se com sua voz distinta, que não renega a cultura clássica nem faz a apologia de modismo, preocupação tão somente em oferecer ao leitor uma poesia que traduz uma cosmovisão do mundo e da arte contemporâneos.

Sobre o Autor

Ronaldo Cagiano: De Cataguases, cidade mineira berço de tradições culturais e importantes movimentos estéticos, surgiu Ronaldo Cagiano. É funcionário da CAIXA. Colabora em diversos jornais do Brasil e exterior, publicando artigos, ensaios, crítica literária, poesia e contos, tendo sido premiado em alguns certames literários. Participa de diversas antologias nacionais e estrangeiras. Publica resenhas no Jornal da Tarde (SP), Hoje em Dia (BH), Jornal de Brasília e Correio Braziliense, dentre outros. Tem poemas publicados na revista CULT e em outros suplementos. Obteve 1º lugar no concurso "Bolsa Brasília de Produção Literária 2001" com o livro de contos "Dezembro indigesto”.

Organizou também várias antologias, entre elas: Poetas Mineiros em Brasília e Antologia do Conto Brasiliense.

 

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