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CASTELO-DE-AREIA*
por Pablo Morenno
*
publicado em 19/03/2006.
Uma multidão correição na praia e o menino é invisível. Um senhor lê as notícias. Um surfista procura uma onda perfeita. Uma família de argentinos caminha. O vendedor de cangas sentou-se na areia para descansar. A menina do quiosque entrega uma casquinha de siri. O salva-vidas observa o horizonte. Mas o menino só enxerga o castelo, as ondas, e o mar.
O menino, um castelo de areia, uma onda. O menino, um castelo-de-areia, uma onda, uma onda. O menino, um castelo de areia, uma onda, uma onda, uma onda.
Quem lhe ensinou a persistência? Quem lhe contou o mito de Sísifo? Que estranha esperança alenta o menino a construir, reconstruir, criar, recriar, montar dezenas de castelos na areia e impassível aguardar seu desmoronamento?
O menino me desconserta. Um castelo, dez castelos, cem castelos. No final do veraneio o menino à beira-mar terá feito e perdido um milhão de castelos. Todos as manhãs o menino senta-se na praia a fazer seus castelos e vê-los ruir sob as ondas.
O menino me desconserta por sua persistência, por sua paciência, mas, sobretudo por sua resignação. O menino não se zanga. O menino não xinga o mar, o menino não esbraveja, o menino não se revolta. O menino é de uma violenta suavidade.
Me sento a observá-lo e me canso; o menino não. Com cinco castelos desfeitos me entedio; o menino não. Contra o mar esbravejo; o menino não. Uma vez eu pensei criar peixes no apartamento, morreu um, morreram dois, troquei por um jardim japonês. Uma vez eu sonhei um sonho que foi frustrado, deixei de sonhar. Uma vez eu tive uma esperança verde que amarelou, passei a ter apenas sépias esperanças.
O menino fazendo castelos-de-areia me inquieta. Que graça encontra em enfadonha empreitada? Não aprende que àquela altura da praia todo castelo-de-areia é mais efêmero que outros castelos-de-areia? Por que não constrói um pouco mais longe do mar? Por que, ao invés de areia, não pensa na agrupação de rochas? Por que não constrói um dique? Por que não brincar com pandorgas como as outras crianças?
Quem sou eu que me entedio? Quem sou eu que abandonei a paciência? Quem sou eu que extraviei a esperança? Quem sou eu que não tem a persistência e que não encontra alegria num castelo-de-areia refeito mil vezes à beira do mar? Onde foi que eu perdi o menino que eu tinha?
Quando perguntei ao menino por que não fazia castelos num ponto mais alto da areia, respondeu-me convicto:
- Não tem graça nenhuma um castelo-de-areia tão longe do mar.
O menino, um castelo-de-areia, uma onda. O menino, um castelo-de-areia, uma onda, uma onda. O menino, um castelo-de-areia, uma onda, uma onda, uma onda. O menino, um castelo-de-areia, uma onda, uma onda, uma onda, um castelo, uma onda, uma onda, uma onda, um castelo, uma onda, um castelo, uma onda, uma onda, uma onda, um castelo, uma onda, uma onda,
Um velhinho fazendo castelos de ar))))))))))
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*Esta forma de grafia é opção pessoal.
Sobre o Autor
Pablo Morenno: Pablo Morenno nasceu em 21.05.1969, em Belmonte, SC, e mora em Passo Fundo, RS. É licenciado em Filosofia e bacharel em Direito. Também é professor de Espanhol em cursinhos pré-vestibular, músico e servidor público federal do Tribunal Regional do Trabalho/4ª Região, e pinta nas horas vagas. Escreve uma coluna semanal de crônicas no jornal O Nacional, de Passo Fundo RS, e Nossa Cidade de Marau-RS. Colabora com os jornais Zero Hora, Direito e Avesso, e com sites de leitura e literatura. É Membro da Academia Passofundense de Letras, ocupando a cadeira cujo patrono é Érico Veríssimo. Como animador cultural e escritor, participa de projetos de leitura do IEL- Instituto Estadual do Livro do RS e de eventos literários no Rio grande do Sul e Santa Catarina. Com suas palestras interdisciplinares e descontraídas, utilizando-se de histórias e da música, conversa com crianças, jovens, pais, professores e idosos sobre a importância da leitura e da arte na vida.Livros publicados: POR QUE OS HOMENS NÃO VOAM? Crônicas, WS Editor e MENINO ESQUISITO, Poesia Infantil, WS Editor. Contato com o Autor: Pablo Morenno
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